terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Concílio Vaticano II

O artigo de Fernando Ocáriz publicado nesta 6.ª feira no L´Osservatore Romano apresenta a posição da Santa Sé nas conversas doutrinais que mantém com a Fraternidade Sacerdotal S.Pio X (FSSPX), fundada em 1970 pelo Arcebispo francês Marcel Lefebvre (1905-1991).

E X C E R T O S    

Que adesão deve ter-se ao Concílio Vaticano II?
O Concílio Vaticano II não definiu nenhum dogma, no sentido que não propôs, mediante acto definitivo, qualquer doutrina.

Contudo o facto de um acto do Magistério da Igreja não ser exercido mediante o carisma da infalibilidade não significa que ele possa ser considerado «falível» no sentido de que transmitiria uma «doutrina provisória» ou «opiniões autorizadas».

Cada expressão de Magistério autêntico deve ser  acolhida como é verdadeiramente: um ensinamento dado por Pastores que, na sucessão apostólica, falam com o «carisma da verdade», «revestidos da autoridade de Cristo», «à luz do Espírito Santo».

Os ensinamentos do Vaticano II têm todos o mesmo valor?
Naturalmente nem todas as afirmações contidas nos documentos conciliares têm o mesmo valor doutrinal e por conseguinte nem todas exigem o mesmo grau de adesão.

As afirmações do Concílio Vaticano II que recordam verdades de fé exigem obviamente a adesão de fé teologal, não porque tenham sido ensinadas por este Concílio, mas porque já tinham sido ensinadas infalivelmente como tais pela Igreja, de forma solene ou pelo Magistério ordinário e universal.

O mesmo assentimento pleno e definitivo é devido às outras doutrinas recordadas pelo Vaticano II que já tinham sido propostas com acto definitivo por precedentes intervenções magisteriais.

Os outros ensinamentos doutrinais do Concílio exigem dos fiéis o grau de adesão denominado «obséquio religioso da vontade e do intelecto».

Um assentimento «religioso», por conseguinte, não fundado em motivações meramente racionais. Esta adesão não se configura como um acto de fé, mas antes de obediência, não simplesmente disciplinar, mas radicada na confiança na assistência divina ao Magistério, e por isso «na lógica e sob o impulso da obediência da fé» .

Nos documentos magisteriais pode haver – como de facto se encontram no Vaticano II – também elementos não propriamente doutrinais, de natureza mais ou menos circunstancial (descrições do estado das sociedades, sugestões, exortações, etc.). Tais elementos devem ser acolhidos com respeito e gratidão, mas não exigem uma adesão intelectual em sentido próprio.


Houve novidades no Concílio Vaticano II? 
Houve no concílio Vaticano II diversas novidades de tipo doutrinal: sobre a sacramentalidade do episcopado, sobre a colegialidade episcopal, sobre a liberdade religiosa, etc.

Face às dificuldades que podem encontrar-se para compreender a continuidade de alguns ensinamentos conciliares com a Tradição, a atitude católica, tendo em consideração a unidade do Magistério, é procurar uma interpretação unitária, na qual os textos do Concílio Vaticano II e os documentos magisteriais precedentes se iluminem reciprocamente.


Como encarar eventuais dificuldades de aceitação?
Alguém interpreta autenticamente o Concílio?
Portanto, a interpretação das novidades ensinadas pelo Vaticano II deve rejeitar, como disse Bento XVI, a hermenêutica da descontinuidade em relação à Tradição, e deve afirmar a hermenêutica da reforma, da renovação na continuidade .

Trata-se de novidades no sentido que explicitam aspectos novos, até àquele momento ainda não formulados pelo Magistério, mas que não contradizem a nível doutrinal os documentos magisteriais precedentes.

Uma interpretação autêntica dos textos conciliares pode ser feita apenas pelo próprio Magistério da Igreja.


Então, e a liberdade do trabalho teológico?
Por isso, no trabalho teológico de interpretação dos trechos que nos textos conciliares suscitem dúvidas ou pareçam apresentar dificuldades, é antes de tudo necessário ter em consideração o sentido no qual as sucessivas intervenções magisteriais entenderam esses trechos.

Contudo, permanecem legítimos espaços de liberdade teológica para explicar de uma forma ou de outra a não contradição com a Tradição de algumas formulações presentes nos textos conciliares e, por isso, para explicar o próprio significado de algumas expressões contidas naqueles trechos.


Em que entram Paulo VI, João Paulo I, João Paulo II e Bento XVI?
Quase meio século depois da conclusão do Concílio Vaticano II, nestes decénios sucederam-se quatro Romanos Pontífices na cátedra de Pedro. Examinando o Magistério destes Papas e a correspondente adesão a ele por parte do Episcopado, uma eventual situação de dificuldade deveria transformar-se em serena e jubilosa adesão ao Magistério, intérprete autêntico da doutrina da fé.

Isto deveria ser possível e desejável mesmo se permanecessem aspectos racionalmente não compreendidos de modo total, deixando contudo abertos os espaços legítimos de liberdade teológica para um trabalho sempre oportuno de aprofundamento.

Como escreveu recentemente Bento XVI, «os conteúdos essenciais que há séculos constituem o património de todos os crentes precisam ser confirmados, compreendidos e aprofundados de maneira sempre nova a fim de dar testemunho coerente em condições históricas diversas do passado»

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