Pio XI, Encíclica Quadrasegimo
Anno (1931)
Como não pode a unidade social basear-se na luta
de classes, assim a recta ordem da economia não pode nascer da livre
concorrência de forças. Deste princípio como de fonte envenenada derivaram para
a economia universal todos os erros da ciência económica «individualista»;
olvidando esta ou ignorando, que a economia é juntamente social e moral, julgou
que a autoridade pública a devia deixar em plena liberdade, visto que no
mercado ou livre concorrência possuía um princípio directivo capaz de a reger
muito mais perfeitamente, que qualquer inteligência criada. Ora a livre
concorrência, ainda que dentro de certos limites é justa e vantajosa, não pode
de modo nenhum servir de norma reguladora à vida económica. Aí estão a
comprová-lo os factos desde que se puseram em prática as teorias de espírito
individualista. Urge portanto sujeitar e subordinar de novo a economia a um
princípio directivo, que seja seguro e eficaz. A prepotência económica, que
sucedeu à livre concorrência não o pode ser; tanto mais que, indómita e
violenta por natureza, precisa, para ser útil à humanidade, de ser
energicamente enfreada e governada com prudência; ora não pode enfrear-se nem
governar-se a si mesma. Força é portanto recorrer a princípios mais nobres e
elevados: à justiça e caridade sociais. É preciso que esta justiça penetre
completamente as instituições dos povos e toda a vida da sociedade; é sobretudo
preciso que esse espírito de justiça manifeste a sua eficácia constituindo uma
ordem jurídica e social que informe toda a economia, e cuja alma seja a
caridade. Em defender e reivindicar eficazmente esta ordem jurídica e social
deve insistir a autoridade pública; e fá-lo-á com menos dificuldade se se
desembaraçar daqueles encargos, que já antes declarámos não serem próprios
dela.
Mais: é muito para desejar que as várias nações, pois que tanto dependem
umas das outras e se completam economicamente, se dêem com todo o empenho, em
união de vistas e de esforços, a promover com prudentes tratados e instituições
uma vantajosa e feliz cooperação económica internacional.
Se deste modo se restaurarem os membros do corpo social e se
restabelecer o princípio regulador da economia, poder-se-lhe-á aplicar de
alguma forma o que o Apóstolo dizia do corpo místico de Cristo: «todo o
corpo organizado e unido pelas articulações de um mútuo obséquio, segundo a
medida de actividade de cada membro, cresce e se desenvolve na caridade».
(...)