(Extractos)
«Não acredito que seja feita justiça no processo Casa Pia»
Entrevista de Carlos Ferreira Madeira,14 de Novembro de 2009
Advogado de Carlos Silvino, o Bibi da Casa Pia, recorda os tempos em que era polícia na 21.ª Esquadra do Parque Eduardo VII.
Chegados a 2009 qual é o ponto da situação do processo Casa Pia?
Estou céptico, porque a população portuguesa já não acredita no sistema de justiça. Já tive oportunidade de dizer isso à sra. dra. juíza. Ninguém acredita que o processo seja imparcial. São quase cinco anos de julgamento e andamos a marcar passo. Completamente, ao sabor dos interesses políticos do PS.
O que pode mudar?
(...) No julgamento da Casa Pia é o poder político que o tem travado, não tenho a mínima dúvida que tem havido pressões sobre os magistrados para não cumprir os prazos, andamos ali, não tem sentido nenhum.
Como têm corrido as audiências, qual o ambiente no tribunal?
O tribunal vai deixando fazer tudo aquilo que é necessário para se prolongar o julgamento. Estar cinco anos a discutir uma acusação contra seis ou sete pessoas com vinte e poucas vítimas, com vinte e poucos queixosos, não é possível, prejudicando os advogados, como eu, que comecei a defender o sr. Carlos Silvino sem cobrar dinheiro, sem honorários. A páginas tantas, aquilo foi-se prolongando, ouvindo as mesmas testemunhas dez, quinze ou vinte vezes...
Como caracteriza a juíza Ana Peres, responsável pelo julgamento?
Ela sabe o que penso dela. Entendo que não tem condições nenhumas neste momento para continuar à frente deste julgamento. Já lhe disse isso directamente. (...)
Há pessoas que deviam ser condenadas neste processo?
Há, sim. (...) Todas. Todas elas. É claro que isto é um processo político em que o Partido Socialista se envolveu ainda na oposição. O Partido Socialista só consegue isto mesmo na oposição porque domina o submundo da política, que é a maçonaria. É aquilo que, como dizia um dia destes um magistrado, no caso um juiz da Relação, o juiz que é maçon vê-se confrontado com irmãos da mesma loja de grau superior, os mestres, sentados no banco dos réus. É impossível, porque na maçonaria, há códigos e leis próprias entre os irmãos.
Está a acusar o Partido Socialista de proteger a maçonaria?
Sim, sem dúvida nenhuma. Nem que me cortassem o pescoço eu diria o contrário.
(...)
Como viu o desfecho do caso Paulo Pedroso?
Toda a gente sabe que o meu cliente disse que o Paulo Pedroso é culpado.
E acredita no seu cliente?
Tenho de acreditar no meu cliente, se não acreditasse não o estava a defender. Mas há factos objectivos, há pessoas que o conhecem, há dados concretos de que o dr. Paulo Pedroso em 1991, pelo menos, estava a fazer entrevistas a miúdos da Casa Pia, o que ele sempre desmentiu até eu o ter confrontado com o seu próprio livro, que conseguimos descobrir e que apresentei no processo. Portanto, o dr. Paulo Pedroso terá feito na Casa Pia mais de 700 entrevistas. Estas coisas começam a bater certo com o que os miúdos dizem, as datas, 1991, 1992. O meu cliente sempre confirmou que o viu, descreveu até a camisa, as calças, quando foi, numa reunião na Casa Pia.
(...)
Quem mais devia estar sentado no banco dos réus da Casa Pia?
Várias pessoas.
Ligadas ao PS?
Também. E a outros partidos. Outras pessoas que deviam lá estar e não estão.
Mas durante o julgamento falou da influência do poder político?
Os miúdos falaram do PS. Não sei porque não falaram de outros. Agora, o que os partidos não podem fazer é uma troca de cromos. O que o PS fez foi atacar o PSD e fazer publicar no "Le Point" um artigo em que atacava dois ministros do PSD. Se alguém do PS, CDS ou de outro partido tem informações, que as denuncie. (...)
É hoje mais próximo do PSD?
Não. Estive 22 anos no PS. E saí em divergências quanto à linhas políticas para a justiça e para a PSP. Mandei entregar uma carta de sete ou oito páginas à Presidência do Conselho de Ministros.
(...)
E os outros acusados no processo?
Não me quero meter nisso, mas o Carlos Cruz saberá muita coisa. Este processo só se manteve assim porque há fortes pressões políticas para abafar isto.
(...)
Os métodos de investigação deviam ter sido outros?
Não podiam porque o poder político movimentou-se sobre a Polícia Judiciária e o Ministério Público. E tentou, de uma forma mortal, castrar a investigação e mesmo o juiz Rui Teixeira. Hoje, o que os portugueses esclarecidos podem ver é um sistema igual ao da ditadura. Não há diferença nenhuma.
Que pode ser feito contra isso?
Só quando os portugueses tiverem coragem para responder. O PS está a destruir completamente o Estado de Direito. E não há forças que se oponham porque o PSD está fragilizado. Temo uma revolta popular. O Estado vai mantendo esta paz podre com subsídios e inserção social.
Como vê este novo caso das escutas. E o processo Face Oculta?
O primeiro-ministro só pode ser escutado se houver uma ordem do Supremo. Mas se ele for escutado noutra conversa, isso não pode constituir base para crime. Não pode ser. O PS alterou a lei para se proteger, é pior que o Berlusconi. (...)
(...)
Como olha para a reforma do processo penal?
Foi uma reforma que resultou da necessidade de o Partido Socialista ter de travar o processo Casa Pia. O PSD e o CDS na altura foram a reboque, talvez porque tivessem também telhados de vidro. O mal não está todo no Partido Socialista, como é óbvio, está no sistema e na mentalidade dos políticos, que há uns anos não eram nada e hoje têm tudo.
(...)
E sobre o bastonário da Ordem dos Advogados, Marinho Pinto?
É um homem do PS e nunca o vi defender ninguém em julgamento. Sempre que o oiço falar é a falar a favor do Partido Socialista.
Preferia os antecessores de Marinho Pinho, nomeadamente José Miguel Júdice?
É óbvio que o dr. José Miguel Júdice foi o pilar da estratégia do Partido Socialista no processo Casa Pia. A Ordem dos Advogados dominou o caso todo, através do dr. José Miguel Júdice. Funcionou no processo como o pivô de toda a trama.
(...)