sábado, 10 de abril de 2010

Quando a esmola é grande...
... o pobre desconfia!

Bernardo Motta, no blog Espectadores

Não há dúvidas de que tem sido uma excelente Páscoa para os inimigos da Igreja. Têm voado pedras e cuspidelas, e anda tudo maluco, com a cabeça a andar à roda, a disparar em todas as direcções. A blogosfera anticatólica anda feliz da vida. Parecem crianças à procura de ovos de Páscoa no jardim.

Mas o mais enraivecido anticatólico, desde que dotado de meio cérebro, começará a desconfiar desta situação.

Veja-se a nova enxurrada de notícias, desta feita provenientes da Noruega. Neste país de tão fortes tradições católicas (desculpem-me a ironia, mas não resisto), estalou mais um mega-escândalo de padres pedófilos. Um caso de abuso por parte de um bispo norueguês, Mueller, ocorrido nos anos 90 em que ele ainda era padre, e revelado pelo Bispo Eidsvig a pedido da Santa Sé, disparou mais este escândalo mediático. Mas a notícia não pode ser a desse caso já antigo. A notícia agora é que a Igreja Católica na Noruega dá conta de que está a receber desde os últimos dias uma avalanche de denúncias de supostos "novos casos".

Veja-se o desgraçado do Bispo Brent Eidsvig, no aeroporto de Oslo, rodeado de uma "trupe" de jornalistas sedentos por mais escândalos.
(Foto: AP Photo/Scanpix, Lise Aserud)



O Bispo Eidsvig terá dito aos jornalistas: "I received so many email tip-offs about possible aggressions and other sexual abuse that the computer server crashed". Ou seja, na sequência da revelação, por parte de Eidsvig, do crime do seu predecessor, começaram a chover "e-mails" de denúncia na caixa de correio de Eidsvig. Será que os acusadores que enviaram estes "e-mails" só se lembraram agora dos abusos?

Eidsvig diz que o seu computador ficou entupido com "e-mails".

Ai, se os jornalistas soubessem de quantos "e-mails" se trata... Se fossem mil "e-mails" recebidos, seria logo noticiado: "Mil casos de abuso por parte de padres pedófilos relevados na Noruega". Não. Melhor ainda: "Há mil padres pedófilos na Noruega".

O que se passa é que, no meio da euforia, ninguém se dá conta (ou não se quer dar conta) de que uma coisa são suspeitas, denúncias (algumas anónimas) ou insinuações. Outra coisa são condenações. Esta confusão está a baralhar muita gente.

Nos EUA, segundo o estudo do John Jay College of Criminal Justice, entre 1950 e 2002 foram suspeitos de abuso sexual de menores 4392 padres e diáconos católicos americanos (num total de 109 694) [1]. Falamos então de uma percentagem de 4% de sacerdotes e diáconos, do total de sacerdotes e diáconos norte-americanos, sob suspeição durante o período em causa. Mas apenas cerca de uma centena foram realmente condenados pelos tribunais civis. Ora, se presumimos que o suspeito é culpado à partida, temos 4.392 abusadores de menores. Mas se respeitamos o princípio de presunção da inocência, e se respeitamos os tribunais, teremos apenas cerca de 100 abusadores de menores (nem todos pedófilos). Outro dado curioso do estudo norte-americano é que dessa centena de condenações, só 54 diziam respeito a condenações por pedofilia (sexo com menores não adolescentes). Mesmo que admitamos que muitas das suspeitas não chegaram aos tribunais, ou que algumas das que chegaram não terminaram em condenação e deveriam ter terminado em condenação, podemos ser pessimistas, e ficar-nos pelo "tecto" de 4% de sacerdotes e diáconos, do total norte-americano, que viram os seus nomes envolvidos em suspeitas de abusos.

Convenhamos: 4% de sacerdotes e diáconos, pegando no caso norte-americano porque este apresentou o maior impacto social, não é um fenómeno "massificado" ou "generalizado" como afirma tanta comunicação social e tantos comentadores de pacotilha.

E há outro dado "incómodo". O relatório do John Jay College of Criminal Justice faz uma análise temporal aos dados estatísticos. O "pico" dos casos de abuso coincide com o "pico" do número de acusações, e calha no ano de 1980. A curva que se pode ver na página 28 do dito estudo é ilustrativa: é uma curva em forma de montanha, com uma curva acentuada de crescimento que se nota a partir de 1960. Depois do "pico" de 1980, a curva desce acentuadamente, até 1995, ano em que atinge os valores de 1950. Interessante, o comportamento desta curva, que sustenta todos aqueles que têm relacionado este fenómeno com a revolução sexual dos anos 60 e 70, bem como todos os que têm dito, em defesa da Igreja, que desde o final do século passado, a Santa Sé tomou as rédeas deste problema. Olhando para esta curva, característica dos EUA, se os números não mentem, algo aconteceu para esta queda acentuada no número de casos entre 1980 e 1995 (ver ainda o gráfico da página 35).
Ainda outro dado "incómodo". Segundo o mesmo relatório, 80,9% dos casos reportados nos EUA são abusos a rapazes[2]. Para aqueles que juram a pés juntos que este escândalo não tem nada a ver com homosexualidade, estes números frios merecem segunda reflexão...

Os números da Alemanha, outro país alvo da especulação em torno dos padres pedófilos, reportam 210.000 casos de abusos de menores desde 1995. Os casos relacionados com padres ou religiosos da Igreja foram apenas 94 desse total. Falamos de 0,04%!

Os números da Irlanda são graves pelo fenómeno social em si, que envolve muita gente, não apenas padres, e não apenas membros da hierarquia da Igreja Católica. Primeiro, há que ver que o Relatório Ryan contém dados desde 1914. É importante saber o intervalo temporal dos dados recolhidos, para fazermos comparações justas em termos de números absolutos de sacerdotes e de casos de abusos!

No Relatório Ryan temos 1090 casos de violência contra menores (sexual, física e psicológica). O total de elementos do clero envolvidos nestes casos é de 23 (0,02%). Muitos dos casos de abuso dizem respeito a pessoal auxiliar educativo (professores, contínuos, etc.).

Eu devo confessar que, no início de Março, quando começou esta palhaçada mediática, eu senti-me sinceramente chocado, porque os "media" faziam passar a imagem de um escândalo em larga escala, quer nos crimes sexuais, quer na ocultação. Passado um mês, penso que os "media" e os agentes anti-católicos forçaram demasiado a barra, e caem no descrédito. Foram várias as notícias desmentidas, e toda a campanha mediática tem pés de barro.

Os crimes, apesar de serem todos graves e horríveis, têm uma dimensão bem diferente da que nos querem vender. A montanha pariu um rato. Notícias como esta da Noruega, ainda por cima um país pouco religioso, e da parte que é religiosa, pouco católico, não ajudam a causa anti-católica. Antes pelo contrário: ajudam ao descrédito.

Esta campanha mediática começa a ser vista por aquilo que é: uma palhaçada imoral. Uma difamação em grande escala. Mas o mais grave não está na campanha em si, pois grande parte dela, como todas as campanhas, é movida pelo dinheiro. O que me parece particularmente grave, em tudo isto, é a sanha com que as notícias são lidas e difundidas. Há muita gente que reage indignada (mesmo que secretamente feliz) a estes escândalos, porque é uma oportunidade imperdível para manifestar um ódio profundo à Igreja Católica.

Os críticos da praxe dirão que estou a exagerar, e a fazer dos católicos as vítimas. Sejamos claros: há aqui dois tipos de vítimas: as dos abusos sexuais e as de difamação. Certamente que é um crime muitíssimo mais grave o de abuso sexual, quando comparado com o de difamação. Mas esta justa comparação não nos deve impedir a nós, católicos, de dizermos "basta!" a esta campanha infame.

É que o ódio anticatólico existe e é bem real. Basta ler, por exemplo, os recentes "posts" de um conhecido blogue nacional, onde pululam corifeus da tribo anticatólica, tribo essa que não tem dado descanso ao teclado nos últimos dias, certamente com um sorriso na cara (sorriso esse que a Internet, felizmente para eles, esconde com eficácia).
Toda esta gente sempre odiou a Igreja Católica. Não a odeiam por causa dos seus rituais, por causa da (treta) da suposta incompatibilidade da religião com a Ciência, não a odeiam por causa de certos erros históricos do passado da Igreja, não a odeiam por causa da sua dimensão à escala global, e não a odeiam por causa do seu imenso trabalho planetário de assistência social.

Odeiam-na por causa da sua mensagem moral. Sejamos claros: a moral da Igreja não é seguida por esta gente. É verdade que também muitos católicos não seguem a moral da Igreja (pelo menos em todos os pontos), mas ao menos estes sabem (ou deviam saber) que estão em erro quando não a seguem. Ora estes inimigos da Igreja defendem em voz alta uma vida plena de imoralidade (aborto, contracepção, homossexualidade, pornografia, eutanásia, entre outras aberrações). E a única voz, em todo o Mundo, que surge para os refutar é a da Igreja Católica. Ora isso deve ser muito irritante. O último baluarte contra a vitória final da imoralidade é a moral católica. É, então, o inimigo a abater.

O alvo é a moral da Igreja, a moral de Jesus Cristo.

A estratégia é simples e clara: atacar o coração moral da Igreja. Acusá-la das piores imoralidades. E, nos dias de hoje, há duas imoralidades especialmente chocantes (e ainda bem) para a opinião pública: o anti-semitismo e o abuso de crianças. Por isso é que os casos contra Pio XII e contra Bento XVI têm tantos paralelos. Do mesmo modo que se procurou "assassinar moralmente" Pio XII, acusando-o de anti-semita e pró-nazi, para que atancando-o, se desfira um golpe forte à moral da Igreja, procura-se agora "assassinar moralmente" Bento XVI, acusando-o de cúmplice na ocultação de crimes, para que atacando-o, se desfira novo golpe forte à moral da Igreja.
Isto não tem nada de novo.

Podemos encontrar coisas muito parecidas nas campanhas anti-católicas dos terroristas da Convenção durante a Revolução Francesa, nas do "risorgimento" italiano na segunda metade do século XIX, na humilhação do clero francês durante a Terceira República, na guerrilha do regime Costa durante a Primeira República, entre tantos outros casos.

A história não se repete, mas há coisas que nunca passam de moda. Cuspir no padre é uma delas. Só que o problema é que estas estratégias, sendo sempre as mesmas, também produzem sempre os mesmos efeitos. O que têm em comum estas estratégias de "assassinato moral" dos representantes da Igreja é sempre o mesmo: a sua relativa eficácia local, e a sua completa ineficácia "à la longue". Se a propaganda anti-católica sempre conseguiu enganar os desgraçados dos ignorantes que, no seu tempo, foram por ela levados, a verdade é que a Igreja deu sempre a volta por cima. Os da Convenção já morreram todos (mataram-se uns aos outros), os Garibaldis desta vida foram à vida, os que profetizavam o final da Igreja nas primeiras décadas do século XX estão hoje a fazer tijolo (apesar de terem, hoje em dia, uns "descendentes" muito espigadotes que ainda julgam que vivem nos tempos do Costa).

Desde os anos 60 que não falta gente (alguns que se dizem católicos) a aproveitar os escândalos mediáticos para tentar pressionar uma mega-reforma (melhor seria dizer, uma implosão) da Igreja. Nesta matéria, os "reformistas" aliam-se aos inimigos não católicos da Igreja, pois na prática, querem todos o mesmo: que a força moral da Igreja desapareça de vez. Quando a Igreja deixar de ser o contraditório da imoralidade, então ela deixa de ser Igreja.
Mas enquanto os cães ladram, a caravana passa...

Bento XVI sabe isso melhor do que ninguém. Ele não governa a Igreja com os olhos postos nos "media", nos abaixo-assinados, nas petições de supostos "povos de Deus", nas sondagens, ou na "vox populi". Ele governa com os olhos postos em Cristo. Deus o ajude, ampare e proteja.


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[1] "The nature and the scope of the problem of sexual abuse of minors by catholic priests and deacons in the United States 1950-2002", John Jay College of Criminal Justice, págs. 26 e 28.

[2] Ibidem, p. 69.







Dossier do Vaticano sobre o escândalo dos padres pedófilos



 http://www.vatican.va/resources/index_po.htm








quarta-feira, 7 de abril de 2010

Bento XVI: polémicas e razões

Elias Couto*

1. Ainda tenho nos ouvidos a exclamação de um jornalista-padre, enviado especial de uma rádio portuguesa para informar sobre o conclave, referindo-se à idade do novo Papa: “Será um pontificado breve, graças a Deus!”. Joseph Ratziger, teólogo e cardeal, sempre fora de separar as águas. Sabia-se que, como Papa, não seria de outra forma. E, por isso, o seu pontificado não poderia deixar de ser marcado pela polémica e pelas oposições internas e externas.
2. Assim tem acontecido. Foi o discurso em Ratisbona, aproveitado por meia Europa para fazer coro com o fundamentalismo islâmico, pseudo-ofendido por uma breve frase do Papa. Bento XVI saiu da polémica como “ignorante” mas criou um novo patamar nas relações com o Islão, patamar cuja palavra-chave é “reciprocidade”. Até hoje, numa Europa de cócoras perante o fundamentalismo islâmico, ninguém lhe agradeceu... Foi a liberalização do uso do ritual anterior ao Vaticano II para celebrar a Eucaristia. Foi o levantamento da excomunhão aos bispos da Fraternidade S. Pio X, escandalizando “judeus e gregos”, por junto. Foi o uso do preservativo e a SIDA... Nas últimas semanas, tem sido a pedofilia de alguns padres e religiosos e a cultura de encobrimento que lhes permitiu levar por diante esses crimes – cultura, aliás, partilhada socialmente e não usada apenas por alguns bispos católicos e por algumas instâncias da Cúria vaticana.
3. Esta última polémica será marcante para o pontificado de Bento XVI. Assinala uma tentativa ignóbil de decapitar a liderança da Igreja Católica, aproveitando os crimes de alguns dos seus membros. Assinala o regresso das culpabilizações colectivas, dos “bodes expiatórios”, ao melhor estilo nazi ou comunista. Assinala também um separar de águas, mesmo no interior da Igreja Católica, decisivo para o seu futuro na Europa. Agora, os bispos sabem que não podem deixar de tomar a sério a tarefa de governar a Igreja que lhes foi confiada. Sabem que não podem deixar correr as coisas, permitindo abusos e desmandos que redundam sempre em grave prejuízo para a causa do Evangelho. Sabem que só estreitamente unidos ao Papa poderão levar por diante o seu ministério num ambiente cada vez mais hostil. Sabem que os candidatos ao ministério presbiteral deverão ser escrutinados de um modo sempre mais exigente, não deixando que a preocupação com a quantidade de padres a ordenar eclipse a exigência de qualidades humanas e virtudes cristãs naqueles que se apresentam à ordenação. Sabem que, cada vez mais, deverão ordenar homens maduros e espiritualmente provados e não jovens – em alguns casos ainda a viver na adolescência –, a quem ninguém entregaria a gestão de uma pequena fábrica, quanto mais o cuidado humano e espiritual de uma comunidade cristã.
4. O pontificado de Bento XVI e toda a dureza que o tem rodeado terá – assim espero – consequências também no modo como os leigos se relacionam com a Igreja e vivem a sua fé. Numa Igreja europeia cada vez mais minoritária e culturalmente perseguida, acabou o tempo do leigo espectador, consumidor de sacramentos e anti-clerical. Hoje, e mais ainda amanhã, os leigos definem-se pela capacidade de viver intensamente a comunhão eclesial, apaixonados pela Igreja, procurando levar o ensino da Igreja para o quotidiano da família, da política, da economia, da cultura – pois só assim poderão levar à sociedade o fermento vivificante do Evangelho... Tudo o resto, sobretudo a dissidência pela dissidência, é mero folclore sociológico e, não raro, contributo evidente para a descredibilização da Igreja.
5. Bento XVI apareceu como um Papa tímido nos contactos pessoais. Alguns tomaram isso como fraqueza. Enganaram-se. O seu estilo talvez não seja o ideal para a hipermediatização de que todos sofremos. Será, no entanto, profundamente benéfico para a Igreja. Assim esta saiba aproveitar o seu exemplo e aprender com a sua sabedoria. Não colherá, certamente, aplausos na praça pública. Servirá, porém, a causa do Evangelho que é, bem vistas as coisas, a causa do homem e da humanização das sociedades.



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Intelectuais da França solidários
com o Papa Bento e vítimas de abusos

Cerca de setenta intelectuais, filósofos, jornalistas, dramaturgos, docentes universitários, artistas e personalidades da sociedade francesa, que já fazem parte de um total de 12 509 assinantes do manifesto "Apelo à verdade" expressaram a sua solidariedade perante a campanha difamatória contra o Papa Bento XVI, que busca apresentá-lo como "encobridor", assim como com as vítimas de abusos cometidos por alguns membros do clero.
O texto, em francês, que pode ver-se em http://www.appelaverite.fr/  já tem as assinaturas, entre muitíssimos outros, de Jean-Luc Marion, da Académie Française, Remi Brague, professor de filosofia e membro do Institut, Françoise Taillandier, escritor, Chantal Delsol, filósofa e membro do Institut, Claude Bébéar, presidente do conselho de vigilância da Axa, Michael Lonsdale, actor, Laurent Lafforgue, matemático condecorado com a medalha Fields, Denis Tillinac, escritor, Alina Reyes, escritora, Alain Joly, pastor luterano, Fabrice Hadjaji, drammaturgo, Bernadette Dupont, senadora, Henri Tincq, jornalista, Jacques Arènes, psicanalista.
O texto assinala que "os casos de pedofilia na Igreja são, para todos os católicos, fonte de profundo sofrimento e dor extrema. Membros da hierarquia da Igreja demonstraram algumas faltas e más atuações, por isso saudamos a vontade do Papa de dar luzes nestes casos".
"Com os bispos, e como membros da mesma Igreja, os leigos católicos assumem o peso dos crimes de alguns sacerdotes e das debilidades de seus superiores; ficam da parte, como Cristo convida a fazer, de quem sofre mais por estes crimes, quer dizer das vítimas, rezando ao mesmo tempo pelos culpados. Quanto a nós, esperamos do coração que toda a verdade emirja e com a ajuda de todos os homens e mulheres de boa vontade se confronte serena e fraternalmente na Igreja Católica tudo isto que pôde gerar-se com estas ofensas, cometidas também contra Cristo".
Os subscritores do manifesto afirmam também: "deploramos a ênfase da escalada mediática que acompanha estes casos. Junto ao direito à informação, legítimo e democrático, não podemos mais que constatar com tristeza como cristãos, mas sobretudo como cidadãos, que numerosos meios de comunicação de nosso país (e no Ocidente em geral) tratam estes casos com parcialidade, escasso conhecimento ou viva satisfação".
Com estas calúnias, indicam, "o rosto da Igreja que aparece actualmente na imprensa não corresponde ao que vivem os cristãos católicos".
"Ao reiterar o nosso horror ante os crimes de sacerdotes pedófilos e a nossa solidariedade às vítimas, convidamos os meios de comunicação a uma ética de responsabilidade que deveria passar por um tratamento mais deontológico em casos como estes. Os fenómenos de ênfase mediático não são certamente reservadas apenas à Igreja, mas não por isso não deixam de nos cansar e nos golpear".
Finalmente, o texto refere-se a "tantos sacerdotes que levam com valor, às vezes na solidão, a mensagem de Cristo. Estamos com eles. Vemos com favor a carta dos bispos da França ao Papa Bento XVI e esperamos ver a Igreja Católica sair com serenidade e responsabilidade desta prova dolorosa".
 
 

segunda-feira, 5 de abril de 2010

A acção dos bispos italianos nas eleições

António Maria Pinheiro Torres

Caros amigos: por ocasião das eleições regionais em Itália do último Domingo, 28 de Março, os bispos italianos vieram a terreiro, não apenas lembrando genericamente que os cristãos devem votar de acordo com a sua fé, mas também especificamente indicando aqueles cinco princípios inegociáveis (palavras do actual Papa, então Cardeal, num documento da Santa Sé sobre a presença dos católicos na política), os mesmos da nossa agenda Mais Vida Mais Família (liberdade de educação e religiosa, vida, família e subsidiariedade), e que eram relevantes mesmo em termos regionais e na própria identidade dos políticos que se candidatavam.
Isto foi muito falado em Itália e sobretudo decisivo na vitória da candidata do centro-direita na região do Lazio (Roma) onde foi muito bem derrotada uma das mais destacadas figuras abortistas da Itália: a Emma Bonino.



Entrevista concedida
pelo P.e Gonçalo Portocarrero de Almada
ao jornal Expresso para efeitos de elaboração
de um artigo sobre o tema e não utilizada

1. Qual a sua opinião sobre o fenómeno da pedofilia na Igreja Católica?

Pe. Gonçalo Portocarrero de Almada: Como é evidente, não posso deixar de lamentar todos os crimes de abusos de menores. Não só lamento sinceramente todos os casos de pedofilia como espero que as entidades civis e eclesiais competentes tomem as medidas adequadas para a total erradicação deste fenómeno na sociedade e na Igreja.
Não ignoro, contudo, que a esmagadora maioria destes casos ocorre no seio das famílias, sobretudo das mais disfuncionais, e das instituições do Estado, como o triste caso Casa Pia demonstrou, e não nas instituições da Igreja que, embora também vulneráveis, são, por regra, exemplares no seu desinteressado e muitas vezes heróico serviço aos mais necessitados.

2. Como explica o facto deste fenómeno ter assolado a Igreja Católica?

Pe. GPA: Há um manifesto exagero na afirmação de que este fenómeno tem «assolado a Igreja». Temo que o sensacionalismo criado à volta destes casos e o modo como a Igreja Católica tem sido a eles associada por certa imprensa não seja de todo inocente.

3. Quer exemplificar?

Pe. GPA: Com certeza. Segundo Massimo Introvigne, que cita um estudo de 2004 do John Jay College of Criminal Justice, foram 958 os padres acusados de pedofilia nos Estados Unidos, num período de 42 anos, tendo resultado a condenação de 54, aproximadamente um por ano. Se se tiver em conta que nesse mesmo lapso de tempo foram condenados pelo crime de pedofilia 6000 professores de ginástica e treinadores desportivos, é necessário concluir que o principal alvo desta campanha mediática não é a pedofilia, que é apenas um pretexto, mas a Igreja e, mais especificamente, o Papa e o sacerdócio católico.
Com efeito, é significativo que, citando Jerkins, a maior parte dos casos de abusos de menores protagonizados nos Estados Unidos por clérigos tenham sido perpetrados por pastores protestantes e não por padres católicos e, no entanto, contrariando a mais elementar justiça e objectividade, são apenas estes últimos, em termos mediáticos, os bodes expiatórios...

4. Entende então que se trata de uma perseguição contra a Igreja Católica?

Pe. GPA: Certamente. Qualquer pessoa de bem, mesmo não sendo católica, vê com preocupação esta crescente onda de intolerância laicista, porque sabe que, hostilizada a Igreja Católica ou neutralizada a sua acção social, quem fica a perder é a família, porque nem o Estado nem nenhuma outra instituição é capaz de assegurar o serviço que a Igreja Católica presta às famílias portuguesas, sobretudo às mais carenciadas.

5. A Igreja portuguesa está a investigar com a necessária diligência as suspeitas sobre padres pedófilos?

Pe. GPA: Muito embora a hierarquia eclesiástica não possa, nem deva, ignorar as suspeitas de padres pedófilos, não só não é sua principal missão investigar estes casos como também não conta com estruturas adequadas para uma tal missão.
Mais do que a lógica da suspeita e da delação, tão ao gosto dos novos fariseus, a Igreja há dois mil anos que se rege pela lógica da confiança e do perdão, seguindo o exemplo do seu Mestre que, embora provocando a indignação dos hipócritas, desculpou a adúltera, como também perdoou a tripla traição de Pedro. Mais do que poder ou tribunal, a Igreja é comunhão e família e, por isso, alegra-se e sofre com todas as glórias e misérias dos seus filhos.
A Igreja, que é santa na sua origem e nos seus fins, é pecadora nos seus membros militantes que, contudo, não enjeita, se neles reconhece um autêntico propósito de conversão.

6. Quer com isso dizer que a Igreja condescende com a pedofilia do seu clero?

Pe. GPA: De modo nenhum, pois a Igreja não condescende nunca com a prevaricação de quantos, investidos na especialíssima responsabilidade do ministério sacerdotal, desonram essa sua condição.
Possivelmente, a condenação mais severa de todo o Evangelho é a que Cristo dirige precisamente aos pedófilos e a quantos são motivo de escândalo para os mais novos. Esse ensinamento evangélico, como todos os outros, não é letra morta na doutrina, nem na praxe eclesial.

7. Pode dar alguns exemplos de documentos da Igreja sobre esta questão?

Pe. GPA: Sem a pretensão de ser exaustivo, permita-me que, a este propósito, recorde alguns dos mais recentes documentos da Santa Sé sobre este particular:
a instrução Crimen sollicitacionis, de 1922 e que, em 1962, o Beato João XXIII reafirmou e na qual se esclarece a obrigação moral de denunciar estes casos;
o Código de Direito Canónico, que reafirma a excomunhão automática, ou seja, a imediata expulsão da Igreja, do confessor que alicia o penitente, qualquer que seja a sua idade ou género, para um acto de natureza sexual;
o Catecismo da Igreja Católica, que renova a condenação da pedofilia;
e o documento De delictis gravioribus, de 2001, que regulamenta o Motu Proprio Sacramentum Sanctitatis tutela, do Papa João Paulo II que, para evitar qualquer local encobrimento destes delitos, atribui a necessária competência à Congregação para a Doutrina da Fé, então presidida pelo actual Papa.

8. Não obstante esta condenação formal da pedofilia, não é verdade que tem faltado vontade política de aplicar as correspondentes sanções?

Pe. GPA: À hierarquia da Igreja não tem faltado a firmeza necessária para punir os eclesiásticos que incorreram em actos desta natureza. Foi o que aconteceu a um cardeal arcebispo de uma capital centro-europeia, que foi recluído num convento e proibido de qualquer acto público. Foi também o caso do fundador de uma prestigiada instituição religiosa, que foi também suspenso do ministério pastoral, demitido das suas funções de governo na estrutura eclesial por ele fundada, que foi sujeita a inspecção canónica, e obrigado a residir em regime de quase-detenção numa casa religiosa.

9. E se se vier a verificar algum caso no clero português?

Pe. GPA: Como se sabe, graças a Deus não há memória de nenhum sacerdote português, diocesano ou religioso, que tenha sido alguma vez condenado por um crime desta natureza. Se porventura se desse também entre nós algum caso, não tenho dúvidas de que o nosso episcopado, de acordo com as normas a que está obrigado, saberia agir com justiça e caridade.

10. Concorda com as críticas veladas de vários sectores da sociedade que acusam a Igreja de pouco fazer para garantir a total transparência destes processos? A maioria dos casos suspeitos é, regra geral, arquivado pelo Ministério Público. Segundo algumas fontes policiais, «as vítimas retraem-se mais tarde, devido ao ascendente dos alegados agressores».

Pe. GPA: Dada a minha sensibilidade cristã e formação jurídica, causa-me algum desconforto o uso e abuso de expressões tão vagas e perigosas como «críticas veladas», «casos suspeitos», «alegados agressores», porque tendem a criar uma suspeição generalizada. Há um princípio geral de inocência que não pode ser contrariado: um político, um professor, um padre ou um desempregado que seja burlão não faz da sua mesma condição todos os políticos, professores, padres ou desempregados. Se um violador que é engenheiro, como o recentemente detido, não infama todos os engenheiros, nem suscita uma caça aos engenheiros violadores, porque razão um padre pedófilo, se o houver, provoca esta tão desmedida reacção nos meios de comunicação social?!

11. Pode-se dizer que a associação entre pedofilia e sacerdócio católico não é arbitrária, na medida em que é entre os padres que tendem a verificar-se delitos desta natureza?

Pe. GPA: Não, porque uma tal pressuposição carece de fundamento, como as estatísticas mais recentes provam. Por exemplo, na Alemanha, segundo Andrea Tornielli foram notificados, desde 1995, 210.000 casos de delitos contra menores, mas apenas 94 desses casos diziam respeito a eclesiásticos, ou seja, um para cada dois mil envolvia algum sacerdote ou religioso católico. O inquérito Ryan, sobre a situação na Irlanda, é também esclarecedor porque, num universo de 1090 crimes cometidos contra menores em instituições educativas, os religiosos católicos acusados de abusos sexuais foram 23.

12. Talvez alguém entenda que, muito embora haja também pedófilos que não são padres, o crime para que mais tendem os sacerdotes católicos é o abuso de menores.

Pe. GPA: Também não é verdade porque, de acordo com Mons. Scicluna, perito da Congregação para a Doutrina da Fé, que é o organismo da Santa Sé que superintende estes casos, entre os anos 2001 e 2010, houve notícia de 300 casos de pedofilia num total de 400 000 padres. Além disso, os abusos de menores são apenas 10% de todas as acções criminais praticadas por sacerdotes católicos.

13. Mas do ponto de vista da psiquiatria, tudo leva a crer que o celibato sacerdotal é, em boa parte, responsável pelos abusos de menores realizados pelo clero católico…

Pe. GPA: Pelo contrário. Manfred Lutz, um psiquiatra especialista na matéria, afirmou que o celibato sacerdotal não só não incita à prática destes crimes como até favorece uma atitude de respeito e de ajuda aos menores. Esta conclusão científica prova-se também pelo facto de, entre os clérigos condenados por este crime, haver mais pastores protestantes, casados, do que sacerdotes católicos, celibatários, e ainda porque a grande maioria dos pedófilos são casados o que, obviamente, não pode ser usado contra o casamento.

14. Consta na opinião pública que a maioria dos casos suspeitos de padres pedófilos, não é objecto de investigação, nem de posterior procedimento criminal…

Pe. GPA: Se assim é, de facto, não é certamente por culpa da Igreja, que nada tem a ver com as investigações policiais, nem muito menos com as diligências judiciais.
Embora se tenda a crer que a Igreja e o seu clero gozam de um tratamento de excelência na sociedade portuguesa, a verdade é que não deve haver instituição pública nem classe profissional mais maltratada nos media do que a Igreja Católica e os seus sacerdotes.

15. Porque o diz?

Pe. GPA: Permita-me que lhe dê um exemplo. Há uns meses atrás, um pacato pároco português foi detido com enorme aparato por quatro ou cinco polícias trajados a rigor, como se o pobre padre de aldeia fosse um perigoso terrorista, quando na realidade era apenas um mero caçador que tinha por licenciar algumas armas. À notícia, transmitida nos noticiários televisivos, foi dado um aparato que, de não ser dramático, teria sido ridículo, até porque aquele pacífico sexagenário não representava nenhum perigo público. Não foi com certeza por acaso que se forjou toda aquela fantástica encenação, como também não foi por acaso que se convidaram as televisões…
Mas factos ocorridos há dezenas de anos numa instituição pública, como a Casa Pia, e de que foram vítimas dezenas de adolescentes, ainda não conhecem uma decisão judicial… Será isto justiça?!

16. Mas não acha que o incumprimento de uma obrigação por um padre é um escândalo?

Pe. GPA: É verdade que é exigível aos prestadores de serviços públicos uma especial responsabilidade: é razoável que o incumprimento de uma obrigação fiscal por parte um governante seja notícia, mas já o não seja se o prevaricador for um anónimo cidadão. Mas o escândalo não pode ser utilizado como arma de arremesso ideológica, sob pena de que aconteça aos padres católicos de agora o que aconteceu aos judeus alemães, durante o regime nazi.

17. Surpreendem-no estes casos de padres pedófilos?

Pe. GPA: Nenhum pecado é surpresa para nenhum padre e todos os padres sabemos que somos capazes de todos os erros e de todos os horrores. Não é por acaso que, na Semana Santa, a Igreja recorda o tristíssimo caso de Judas Iscariotes, que muito significativamente os evangelistas não silenciaram, quando poderiam tê-lo feito, a bem do prestígio da sua condição sacerdotal e do bom nome da Igreja. Graças a Deus conheço muitos padres, quer seculares como eu, quer religiosos, e confesso-lhe que não conheço nenhum que não mereça a minha admiração.

18. Tem ouvido, mesmo que rumores, de casos de pedofilia por parte de alguns padres? Ou é uma completa surpresa para si a existência deste tipo de casos, que acabam por manchar o nome da instituição secular?

Pe. GPA: Tenho uma enorme devoção por todos os meus irmãos sacerdotes, na certeza de que até no menos bom há, pelo menos, a grandeza do dom e da missão a que foi chamado. Também não ignoro que nenhum de nós, por mais qualidades que possa ter, é indigno dessa graça, pelo que nunca me surpreenderá encontrar nos outros alguma da miséria que diariamente descubro em mim. Mas, mesmo que essa constatação possa de algum modo perturbar-me, confesso-lhe que mais do que a traição de Judas, me admira a santidade e o martírio dos outros onze apóstolos. Talvez por isso, não tenho tempo para ouvir esses rumores de que fala, ou tempo para olhar para essas manchas a que alude e que não ignoro, porque prefiro contemplar a eterna beleza da Igreja, que procuro amar com todo o meu coração.

19. Já denunciou algum caso às autoridades eclesiásticas?

Pe. GPA: Denunciar é um termo que não faz parte do meu dicionário e, como padre, a minha missão não é acusar o culpado, mas perdoar o arrependido.

20. Já teve alguma suspeita de abusos por parte de algum colega seu?

Pe. GPA: Como não é meu hábito falar das vidas alheias, permita-me que, em vez de falar dos meus colegas, lhe diga o que eu desejaria que me acontecesse se caísse numa dessas situações, até porque é isso mesmo que desejo aos meus irmãos sacerdotes.
Se tivesse um dia a desgraça de incorrer nalgum comportamento menos próprio da minha condição sacerdotal, agradeceria que os meus irmãos na fé, padres ou não, tivessem a coragem de me fazerem a correcção fraterna, tal como Nosso Senhor determinou. Se o meu desvario persistisse, não obstante essa caridosa advertência, aceitaria de muito bom grado que o meu bispo utilizasse todos os meios ao seu dispor, sem excluir os civis e penais, para a minha emenda, na certeza de que essa expiação, embora dolorosa, contribuiria decerto para o bem das almas e para a minha salvação.




 



domingo, 4 de abril de 2010

Como é possível?

Como é possível?
-- pergunta Marcello Pera
numa carta a Mons. Negri



O Bispo Luigi Negri revela que o filósofo e senador Marcello Pera, um agnóstico, lhe escreveu o seguinte:

«Como é possível que mil milhões de cristãos assistam em silêncio e impotentes à tentativa de destruir o Papa, sem se aperceberem que depois disso já não haverá salvação para ninguém?»