Senza
Pagare, 28
de Fevereiro de 2019
Padre Karol Miklosko: Santo Padre, sou Pe. Karol Miklosko e venho da Europa, exactamente da
Eslováquia, e sou missionário na Rússia. Quando celebro a Santa Missa
encontro-me a mim mesmo e compreendo que ali encontro a minha identidade, a
raiz e a energia do meu ministério. O sacrifício da Cruz revela-me o Bom Pastor
que dá tudo pelo rebanho, por cada ovelha, e quando digo: «Isto é o meu
corpo... isto é o meu sangue» oferecido e derramado em sacrifício por vós,
então compreendo a beleza do celibato e da obediência, que livremente prometi
no momento da ordenação. Mesmo com as dificuldades naturais, o celibato
parece-me óbvio, olhando para Cristo, mas sinto-me transtornado ao ler tantas
críticas mundanas a este dom. Peço-lhe humildemente, Padre Santo, que nos
ilumine sobre a profundeza e o sentido autêntico do celibato eclesiástico.
Papa Bento XVI: Obrigado pelas duas partes da sua pergunta. A primeira, onde mostra o
fundamento permanente e vital do nosso celibato; a segunda, que mostra todas as
dificuldades nas quais nos encontramos no nosso tempo. A primeira é importante,
isto é: o centro da nossa vida deve ser realmente a celebração quotidiana da
Sagrada Eucaristia; e aqui são centrais as palavras da consagração: «Isto é o
meu Corpo, isto é o meu Sangue», ou seja: falamos «in persona Christi». Cristo permite
que usemos o seu «eu», que falemos no «eu» de Cristo, Cristo «atrai-nos para si»
e permite que nos unamos, une-nos com o seu «eu».
E assim, através desta
acção, este facto que Ele nos «atrai» para si mesmo, de modo que o nosso «eu»
se torna um só com o seu, realiza a permanência, a unicidade do seu Sacerdócio;
assim Ele é sempre realmente o único Sacerdote, e contudo muito presente no
mundo, porque nos «atrai» para si mesmo e deste modo torna presente a sua
missão sacerdotal. Isto significa que somos «atraídos» para o Deus de Cristo: é
esta união com o seu «eu» que se realiza nas palavras da consagração. Também no
«estás perdoado» – porque nenhum de nós poderia perdoar os pecados – é o «eu»
de Cristo, de Deus, o único que pode perdoar. Esta unificação do seu «eu» com o
nosso implica que somos «atraídos» também para a sua realidade de Ressuscitado,
que prosseguimos rumo à vida plena da ressurreição, da qual Jesus fala aos
Saduceus em Mateus, capítulo 22: é uma vida «nova», na qual já estamos além do matrimónio
(cf. Mt 22, 23-32).
É importante que nos
deixemos sempre de novo embeber por esta identificação do «eu» de Cristo
connosco, por este ser «lançados» para o mundo da ressurreição. Neste sentido,
o celibato é uma antecipação. Transcendamos este tempo e caminhemos em frente,
e assim «atrairemos» para nós próprios e o nosso tempo rumo ao mundo da
ressurreição, à novidade de Cristo, à vida nova e verdadeira. Por conseguinte,
o celibato é uma antecipação tornada possível pela graça do Senhor que nos «atrai»
para si rumo ao mundo da ressurreição; convida-nos sempre de novo a
transcender-nos a nós mesmos, este presente, rumo ao verdadeiro presente do
futuro, que hoje se torna presente. E chegamos a um ponto muito importante.
Um grande problema da
cristandade do mundo de hoje é que já não se pensa no futuro de Deus: só o
presente deste mundo parece suficiente. Queremos ter só este mundo, viver só
neste mundo. Assim fechamos as portas à verdadeira grandeza da nossa
existência. O sentido do celibato como antecipação do futuro é precisamente
abrir estas portas, tornar o mundo maior, mostrar a realidade do futuro que
deve ser vivido por nós como presente. Por conseguinte, viver assim num
testemunho da fé: cremos realmente que Deus existe, que Deus tem a ver com a
minha vida, que posso fundar a minha vida em Jesus, na vida futura.
E conhecemos agora as
críticas mundanas das quais o senhor falou. É verdade que para o mundo
agnóstico, o mundo no qual Deus não tem lugar, o celibato é um grande
escândalo, porque mostra precisamente que Deus é considerado e vivido como
realidade. Com a vida escatológica do celibato, o mundo futuro de Deus entra
nas realidades do nosso tempo. E isto deveria desaparecer!
Num certo sentido, esta
crítica permanente contra o celibato pode surpreender, num tempo em que está
cada vez mais na moda não casar. Mas este não-casar é uma coisa total,
fundamentalmente diversa do celibato, porque o não-casar se baseia na vontade
de viver só para si mesmo, de não aceitar qualquer vínculo definitivo, de ter a
vida em todos os momentos em plena autonomia, decidir em qualquer momento como
fazer, o que tirar da vida; e portanto um «não» ao vínculo, um «não» à
definitividade, um ter a vida só para si mesmos.
Enquanto o celibato é
precisamente o contrário: é um «sim» definitivo, é um deixar-se guiar pela mão
de Deus, entregar-se nas mãos do Senhor, no seu «eu», e portanto é um acto de
fidelidade e de confiança, um acto que supõe também a fidelidade do matrimónio;
é precisamente o contrário deste «não», desta autonomia que não se quer
comprometer, que não quer entrar num vínculo; é precisamente o «sim» definitivo
que supõe, confirma o «sim» definitivo do matrimónio. E este matrimónio é a
forma bíblica, a forma natural do ser homem e mulher, fundamento da grande
cultura cristã, das grandes culturas do mundo. E se isto desaparecer, será
destruída a raiz da nossa cultura.
Por isso, o celibato
confirma o «sim» do matrimónio com o seu «sim» ao mundo futuro, e assim
queremos ir em frente e tornar presente este escândalo de uma fé que baseia
toda a existência em Deus. Sabemos que ao lado deste grande escândalo, que o
mundo não quer ver, existem também os escândalos secundários das nossas
insuficiências, dos nossos pecados, que obscurecem o verdadeiro e grande escândalo,
e fazem pensar: «Mas, não vivem realmente no fundamento de Deus!». Mas há tanta
fidelidade!
O celibato, mostram-no
precisamente as críticas, é um grande sinal de fé, da presença de Deus no
mundo. Rezemos ao Senhor para que nos ajude a tornar-nos livres dos escândalos
secundários, para que torne presente o grande escândalo da nossa fé: a
confiança, a força da nossa vida, que se funda em Deus e em Jesus Cristo!
sábado, 2 de março de 2019
O celibato não é o problema, é a solução
Pe. Carter Griffin, Actualidade Religiosa, 27 de Fevereiro de 2019
Muitos católicos, incluindo os mais fiéis, parecem ter desistido de defender o celibato sacerdotal. Na nossa era pós-revolução sexual, muitos vêem o celibato como uma repressão pouco saudável das vontades sexuais, fomentando a epidemia de abusos sexuais na Igreja que hoje conhecemos. Segundo esta linha de pensamento, se nos queremos livrar dos abusos sexuais na Igreja, temos de nos livrar do celibato.
Esta é uma solução que, nas palavras de um crítico literário, é «limpa, plausível e errada».
O problema não é o celibato. Dizer que os abusos sexuais entre o clero são causados pelo celibato é como dizer que a culpa do adultério é do casamento. Em ambos os casos estamos perante violações de votos sagrados, promessas que beneficiam da ajuda do Senhor para serem vividas fielmente. Por outras palavras, permitir aos padres que se casem não evitaria as transgressões sexuais. O casamento, infelizmente, não é um espaço imune ao escândalo e ao abuso sexual.
O problema não está no celibato, está no celibato mal vivido. É causado por padres que não vivem castamente. A resposta não é a eliminação do celibato, mas exigir que os padres, tal como as pessoas casadas, vivam a exigência da sua vocação.
De facto, o celibato é em si um dom precioso e insubstituível para a Igreja. Costuma ser definido de forma negativa, como «não casar», mas é antes uma escolha positiva, uma forma poderosa de amar, com uma unicidade de propósito e uma abertura de coração única. Permite a um padre viver a sua paternidade espiritual com particular força e eficácia.
Durante séculos os benefícios espirituais do celibato sacerdotal enriqueceram a Igreja e até a cultura mais alargada. Abolir o celibato num momento de desespero não só não resolveria o problema dos abusos sexuais, como também privava as gerações futuras das inúmeras graças de paternidade espiritual que nos chegam através do celibato sacerdotal.
Mas então como é que podemos explicar esta tempestade de escândalos? A história não é bonita, mas há boas notícias para o fim.
Em primeiro lugar, durante décadas houve surpreendentemente pouco escrutínio dos candidatos à formação sacerdotal. Normalmente bastava a recomendação de um pároco e uma demonstração de aptidão académica, não havendo investigação rigorosa da maturidade espiritual nem do carácter moral, referências ou exames psicológicos.
A Igreja insistiu persistentemente que homens com inclinações homossexuais não deviam ser admitidos ao seminário (o documento mais recente neste sentido foi aprovado pelo Papa Francisco em 2016). Todavia, estes homens eram admitidos em grande número.
A maioria dos padres com atracção pelo mesmo sexo não são, claro, culpados de abusos sexuais e vivem fielmente. Ainda assim, a grande maioria dos casos de abusos por padres envolvem o abuso homossexual de rapazes. Por mais controversa que tenha sido, a sabedoria da Igreja tornou-se hoje claríssima. Ignorá-la tem tido consequências terríveis para a vida de milhares de jovens ao longo de várias décadas.
Em segundo lugar, durante anos os seminaristas receberam uma formação lamentavelmente inadequada para viver o celibato casto. Segundo o testemunho de padres formados nesses anos turbulentos entre as décadas de 70 e 80, a vida interior e as práticas ascéticas necessárias para sustentar uma castidade saudável não eram inculcadas. Muitos homens foram mesmo ordenados com a ideia errada, reforçada pelos formadores no seminário, de que a obrigação do celibato seria em breve abolida.
Nalguns seminários existia uma cultura de libertinagem sexual entre seminaristas e até entre formadores que corrompia jovens vulneráveis ou afastava, enojados, os que procuravam a virtude. A situação era tanto pior quanto, em muitos seminários, a dissidência teológica e a experimentação litúrgica eram uma praga, levando a uma duplicidade hipócrita que os homens levaram com eles para o sacerdócio.
A infidelidade intelectual conduz, invariavelmente, à infidelidade moral. Se eu posso distorcer os ensinamentos da Igreja ao sabor das minhas opiniões, preferências e desejos, porque é que hei-de limitar essa arrogância às proposições dogmáticas e normas litúrgicas? Porque não aos preceitos morais também? O preço a pagar na Igreja pela dissidência que durante anos fermentou nas faculdades de teologia tem sido muito alto tanto em termos de confusão doutrinal e litúrgica como, diria, em termos de abusos sexuais.
Por fim, depois de ordenados, alguns dos padres que cresceram neste clima de duplicidade permissiva foram, sem grandes surpresas, infiéis. E raramente foram censurados por isso pelos seus superiores. Alguns foram transferidos para novos serviços, quase nenhum foi demitido do estado clerical. Muitos bispos perderam a coragem e a confiança. A dimensão da corrupção entre o clero era uma vergonha embaraçosa para os bispos e o resultado é que surgiu uma cultura de profundo secretismo que agora está a ser revelada.
Felizmente a história não acaba aqui. Contra todas as expectativas, muitos padres e bispos permaneceram fiéis através dessas décadas negras e hoje honramos o seu testemunho heroico. Depois, em 1992, foi publicado o documento seminal Pastores Dabo Vobis em que São João Paulo II propôs um retrato estimulante do sacerdócio e da formação nos seminários.
Nos anos seguintes este documento foi aplicado de forma desigual pelo mundo, mas o aumento da qualidade da formação foi inquestionável. Os requisitos para admissão na maioria das dioceses têm aumentado e a qualidade de formação na maioria dos seminários melhorou drasticamente. Embora muitas pessoas não o compreendam, a reforma do clero começou há bem mais de duas décadas.
Claro que ainda há muito para fazer. Uma vez que o celibato é uma forma privilegiada de viver a paternidade espiritual, devemos continuar a melhorar a selecção e formação de futuros padres à luz dessa paternidade. Eles devem estar imbuídos de uma identidade masculina confiante e um desejo normal e saudável pelo casamento e pela paternidade, bem como a capacidade madura de poder abdicar destes grandes dons para se poderem focar na paternidade sobrenatural e possuir, ou demonstrar aptidão para, as qualidades e virtudes humanas dos melhores pais naturais.
Depois de ordenados, os padres devem ter de viver segundo os mais altos padrões de castidade. Deve-se lidar com as violações desse compromisso de forma consistente, imediata e justa, com a seriedade correspondente a uma violação de confiança grave contra a família espiritual. A castidade – serena, profunda e alegre – ao serviço da paternidade espiritual é sem dúvida o caminho para uma reforma genuína no sacerdócio.
Com a melhor das intenções, os médicos medievais costumavam tratar as doenças sangrando os seus pacientes. Sem o saber, estavam a privá-los dos nutrientes de que precisavam para se curar. Aqueles que procuram curar a doença dos abusos sexuais na Igreja sangrando-a da graça do celibato não conseguirão curar a doença e privarão o corpo de Cristo dos nutrientes tão necessários à restituição da saúde.
Se queremos abordar o problema dos abusos sexuais praticados por membros do clero, podemos começar por exigir a mesma fidelidade aos nossos padres que exigimos a toda a gente, convidando-os a abraçar, através do dom do celibato, as bênçãos da paternidade sacerdotal de que precisamos mais do que nunca.
O padre Carter Griffin é sacerdote da Arquidiocese de Washington. Está envolvido, desde 2011, com a selecção e formação de seminaristas no Seminário São João Paulo II, em Washington, DC. O padre Griffin é licenciado pela Universidade de Princeton e é ex-oficial da marinha americana. O seu livro Why Celibacy?: Reclaiming Fatherhood of the Priest, será publicado pela Emmaus Road na Primavera. Uma versão mais longa desta deste artigo pode ser lido no site do First Things.
domingo, 24 de fevereiro de 2019
Cardeal Burke e Cardeal Brandmüller publicam Carta Aberta sobre abusos sexuais e «lobby gay»
Cardeal Burke e Cardeal Brandmüller |
Carta Aberta
aos Presidentes das Conferências Episcopais
Caros irmãos, Presidentes das Conferências Episcopais,
É com profunda aflição
que nos dirigimos a todos vós! O mundo católico está desorientado e levanta uma
pergunta angustiante: para onde está indo a Igreja?
Diante desta deriva, hoje em curso, pode parecer que o problema se reduz ao problema dos abusos de menores, um crime horrível, especialmente se perpetrado por um sacerdote, que, todavia, não é senão uma parte de uma crise bem mais ampla.
A chaga da agenda
homossexual difunde-se no seio da Igreja, promovida por redes organizadas e
protegida por um clima de cumplicidade e de conspiração de silêncio («omertà»).
Como é evidente, as raízes deste fenómeno encontram-se nessa atmosfera de
materialismo, relativismo e hedonismo, em que se põe abertamente em discussão a
existência de uma lei moral absoluta, ou seja, sem excepções.
Acusa-se o clericalismo
de ser responsável pelos abusos sexuais, mas a primeira e a principal
responsabilidade do clero não recai sobre o abuso de poder, mas em se ter
afastado da verdade do Evangelho. A negação, até mesmo em público, por palavras
e nos factos, da lei divina e natural, está na raiz do mal que corrompe certos
ambientes da Igreja.
Diante de tal situação,
cardeais e bispos calam. Também vós vos calareis aquando da reunião convocada
para o próximo dia 21 de Fevereiro, no Vaticano?
Em 2016, estivemos entre
os que interpelaram o Santo Padre acerca dos dubia que
dividiam a Igreja após a conclusão do Sínodo sobre a família. Hoje, esses dubia não
só continuam sem receber qualquer resposta, mas são apenas parte de uma crise
da fé mais geral. Por isso, vimos encorajar-vos a que levanteis a vossa voz
para salvaguardar e proclamar a integridade da doutrina da Igreja.
Rezamos e pedimos ao
Espírito Santo para que assista a Igreja e ilumine os pastores que a guiam.
Neste momento, é urgente e necessário um acto resolutório. Confiamos no Senhor
que nos prometeu: «Eu estarei sempre convosco até ao fim dos tempos» (Mt 28, 20).
Walter Card. Brandmüller
Raymond Leo Card. Burke
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