Pedro Afonso, Observador, 12 de
Abril de 2017
Muitos pais têm perdido a autoridade
sobre os seus filhos, e com frequência capitulam quando é necessário impor
limites ou aplicar castigos. Ouço-os dizer, num tom resignado, que «agora é
tudo assim».
O País ficou chocado com a notícia
da expulsão de mais de um milhar de jovens devido a actos de vandalismo num
hotel de Torremolinos, onde estavam hospedados. Mas o que é que pode explicar
esta autêntica olimpíada de vandalismo e de destruição? Existem várias razões,
mas talvez a mais importante seja a ausência de uma capacidade que os clássicos
chamavam de temperança (do latim temperantia), mais recentemente
designada por autocontrolo e que faz parte da «Inteligência emocional».
Quando não se possui autocontrolo
são transferidos para o comportamento um conjunto de impulsos mais primitivos,
entre os quais se encontram a busca do prazer imediato e a violência. Nestas
idades o córtex pré-frontal ainda não atingiu a maturidade necessária para
controlar de forma adequada os impulsos e as emoções provenientes da activação
de outra estrutura nervosa chamada amígdala e que integra o sistema límbico.
Mas este aspecto não serve por si só para tornar inimputáveis os jovens, nem
tão-pouco para justificar o seu comportamento, serve apenas para reforçar a
necessidade de se defender uma educação com uma componente normativa, de modo a
serem transmitidas regras e um sentido de responsabilidade.
Neste contexto, é totalmente
incompreensível que se organize uma viagem de finalistas com o «bar aberto»,
possibilitando o consumo de bebidas alcoólicas a menores de forma totalmente
desregrada. Ora, nestas idades é o mesmo que dizer «podes beber até caíres para
o lado», e muitas vezes caem mesmo para o lado sem darem por isso. Quando se
bebe álcool o objectivo é fazê-lo de forma moderada, facilitando o convívio
social, e não propriamente beber até atingir o coma alcoólico, como
infelizmente acontece cada vez mais nestas idades.
Se o autodomínio é uma virtude, há
muitos jovens que não conseguem desenvolver esta capacidade e levam esta
limitação para a vida adulta, tornando-se pessoas imaturas, escravos dos
próprios desejos, com grandes dificuldades de adaptação e com poucas
probabilidades de sucesso na sua vida familiar, social e profissional.
Nas últimas décadas houve uma
tendência para se implementar modelos educativos experimentais teóricos, como
uma vertente demasiado desresponsabilizadora, totalmente dissociados da
realidade psicobiológica humana. Os resultados estão à vista: casos crescentes
de indisciplina, desautorização da figura do professor e uma desvalorização do
ensino. A sociedade não melhorou, e este modelo acaba por contribuir para que
muitos jovens perpetuem a sua adolescência na idade adulta, através de uma
atitude perante a vida irrealista, governada pelos desejos, repleta de direitos
e desprovida de deveres.
Talvez por isso, as expulsões de
alunos das salas de aula, por razões disciplinares, continuem a ser demasiado
frequentes nalgumas escolas. Há dias escutei um relato de uma professora que
tinha expulso 15 dos 30 alunos da turma por indisciplina. Percebe-se que há um
ambiente difícil. Estes casos fazem da actividade docente um exercício
insuportável de paciência, comprometem a saúde psíquica dos professores, e
originam uma tensão constante que nem o melhor dos ansiolíticos consegue
atenuar. Estas situações de indisciplina revelam comportamentos anti-sociais
que — embora num modelo de menor escala, e sem o efeito potenciador do álcool e
das drogas —, acabam por replicar a situação de expulsão dos finalistas em
Torremolinos.
Muitos pais têm perdido a autoridade
sobre os seus filhos, e com frequência capitulam quando é necessário impor
limites ou aplicar castigos perante comportamentos desviantes. Ouço-os dizer,
num tom resignado, «agora é tudo assim», «todos os amigos consomem álcool e
drogas», etc. Porém os limites e as repreensões também têm uma função
pedagógica, ajudam a estruturar a personalidade, preparando os adolescentes
para a vida adulta, já que na vida real todos nós somos confrontados com
limites e consequências quando desrespeitamos determinadas regras e obrigações.
Os actos de vandalismo ocorridos em Espanha,
cometidos provavelmente por um número restrito de jovens, acabaram por dar uma
péssima imagem dos colegas, humilharam os pais e desprestigiaram o País.
Afinal, o autocontrolo é uma virtude humana que deve ser ensinada e aprendida.
Como disse Benjamin Franklin «A fúria tem sempre uma razão, mas raramente uma
boa razão».