terça-feira, 14 de novembro de 2017

A crise migratória deixa a Europa de pernas para o ar

Milhares de migrantes a chegar a pé a uma estação de comboios em Tovarnik, Croácia
em 17 de Setembro de 2015.

(Foto Jeff J Mitchell/Getty Images)

Giulio Meotti, Gatestone Institute, 13 de Novembro de 2017

Original em inglês: The Migrant Crisis Upended Europe

Tradução: Joseph Skilnik
  • «A crise migratória é o '11 de Setembro' da União Europeia... Naquele dia, em 2001, tudo mudou nos Estados Unidos. Num minuto apenas, os EUA deram-se conta da sua vulnerabilidade. Os migrantes causam o mesmo efeito na Europa... A crise migratória arruina profundamente os ideais da democracia, tolerância, bem como os princípios liberais que compõem o cenário ideológico.» — Ivan Kratsev, presidente do Centro de Estratégias Liberais de Sófia e membro do Instituto de Ciências Humanas de Viena, no Le Figaro.
  • O povo europeu olha com desprezo as instituições da União Europeia. Lê-a à luz do multiculturalismo e da imigração, não é apenas indiferente aos seus próprios problemas, mas somam a estes os que já existem.
  • «Somos uma comunidade cultural, o que não significa que somos melhores ou piores, somos simplesmente diferentes do mundo exterior... a nossa mente aberta e tolerância não podem significar deixar de proteger a nossa herança», Donald Tusk, presidente da Comissão Europeia.
Poucas semanas depois que a Alemanha abriu as fronteiras para a entrada de mais de um milhão de refugiados do Médio Oriente, África e Ásia, o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, alertou que a crise migratória poderia «desestabilizar as democracias». Ele foi tachado de demagogo e xenófobo. Dois anos mais tarde, a previsão de Orbán confirmou-se. Conforme explica o Website Político: «a maioria dos líderes da UE ecoam as palavras do primeiro-ministro húngaro» e agora ele já pode afirmar: «a nossa posição está lentamente a tornar-se a posição maioritária».

Parece que muitos na Europa já entenderam o que Ivan Krastev, presidente do Centro de Estratégias Liberais de Sófia e membro do Instituto de Ciências Humanas de Viena, explicou recentemente ao
Le Figaro:

«A crise migratória é o '11 de Setembro' da União Europeia... Naquele dia, em 2001, tudo mudou nos Estados Unidos. Num minuto apenas, os EUA deram-se conta da sua vulnerabilidade. Os migrantes causam o mesmo efeito na Europa. Não é o tamanho do contingente que desestabiliza o velho mundo... A crise migratória arruina profundamente os ideais da democracia, tolerância e progresso, bem como os princípios liberais que compõem o cenário ideológico. É um divisor de águas na dinâmica política do projecto europeu».

A migração está a ter um expressivo impacto, por exemplo, nas finanças públicas da Europa. Veja os dois países mais afectados. O governo federal da Alemanha gastou 21,7 biliões de euros em 2016 só com a migração. Fora isso consta que o orçamento da Alemanha para a segurança subirá um terço no ano corrente, de 6,1 biliões para 8,3 biliões de euros.

Em Itália o ministro da Economia e Finanças anunciou recentemente que o país irá gastar 4,2 biliões em 2017 com os migrantes (um sétimo de todo o orçamento de Itália para 2016). A Espanha anunciou recentemente que no Norte de África, a cerca que contorna os enclaves de Ceuta e Melilla, que impede que os migrantes entrem em território espanhol, receberá uma injecção suplementar de 12 milhões de euros. Em todos os cantos da Europa, os países estão a disponibilizar recursos extraordinários para tratar da crise migratória, que também mudou o cenário político do velho mundo.

As recentes vitórias de Sebastian Kurz nas eleições da Áustria e de Andrej Babis nas da República Tcheca engrossaram, ao que tudo indica, o grupo de países da Europa Central e Oriental que se opõem a Bruxelas, países estes que não querem aceitar a entrada do contingente de migrantes exigidos pela União Europeia. A questão da imigração está a dividir a Europa em termos ideológicos. Não são apenas cercas, são rivalidades, desconfianças e ódios que agora dividem mais extensamente do que nunca o projecto europeu. O povo europeu olha com desprezo as instituições da União Europeia. Lê-a à luz do multiculturalismo e da imigração, não é apenas indiferente aos seus próprios problemas, mas somam a estes os que já existem.

Outro terramoto político ligado à crise migratória é «o declínio da social-democracia no Ocidente», conforme salientou recentemente Josef Joffe, editor do Die Zeit. Em toda a Europa, a crise da migração praticamente acabou com os partidos sociais-democratas, que há muito se sabe são incapazes de lidar com o problema. Há vinte anos estes partidos liberais de esquerda governavam em tudo quanto é canto, por exemplo: Espanha, Grã-Bretanha, Alemanha, mas agora estão na oposição, menos em Itália. Da Noruega à Áustria, a Europa é governada pelos conservadores.

Mais de metade das conspirações terroristas ocorridas na Alemanha desde o início da crise dos migrantes em 2014 envolveram migrantes, de acordo com as manchetes da época e de um estudo da Heritage Foundation. Além disso, o Estado Islâmico, agora derrotado em Raqqa, aproveitou-se da desestabilização causada pela guerra civil na Síria e tornou-se uma das principais forças motrizes da crise migratória. A migração tem dado grandes dores de cabeça no tocante à segurança da Europa. A partir do território conquistado, o ISIS lançou ataques terroristas de grande vulto no velho mundo.

A crise migratória também teve como consequência o fortalecimento estratégico do presidente turco Recep Tayyip Erdogan na Europa. Ele vem chantageando os países europeus ameaçando-os: se biliões de euros e certas concessões políticas não lhe forem outorgadas, irá abrir as fronteiras da Turquia para que milhões de migrantes inundem a Europa. Erdogan não só exigiu da Europa a prisão de escritores e jornalistas, mas também tentou influenciar as eleições na Holanda e na Alemanha apelando para os seus partidários turcos.

Um documento do Pew Research mostra como a migração está a transformar os países europeus. Somente em 2016, a população da Suécia cresceu mais de 1%. O aumento é atribuído à migração em massa, a segunda mais alta da UE. O número de imigrantes aumentou de 16,8% para 18,3% da população sueca entre 2015 e 2016.

Áustria e Noruega, dois países com grandes contingentes de imigrantes (no mínimo 15% em 2016), registaram um aumento populacional de 1% em relação a 2015. O jornal Die Welt relatou recentemente que 18,6 milhões de residentes alemães, um quinto da população total da Alemanha, já é de origem migrante.

O Centro Machiavelli na Itália denunciou, segundo o estudo «como a imigração está a mudar a demografia italiana», que uma guinada «sem precedentes» na demografia da Itália está em curso devido à crise migratória.

Abriram a caixa da Pandora da revolução demográfica.

Há dois anos, o primeiro-ministro húngaro Viktor Orbán, era a única voz na Europa a falar da necessidade de manter a Europa «cristã». Agora, Donald Tusk, presidente do Conselho Europeu, um dos seus adversários mais ferrenhos salientou:

«Somos uma comunidade cultural, o que não significa que somos melhores ou piores, somos simplesmente diferentes do mundo exterior... a nossa mente aberta e tolerância não podem significar deixar de proteger a nossa herança».

Em 2015 qualquer conversa sobre «cultura» era condenada como «racismo». Agora está tornar-se parte da grande massa.

Ao tentar lidar com a guerra dos islamistas contra os ideais ocidentais, cultura e religião e o choque cultural que eles criaram, a Europa ficou de pernas para o ar.