José Ribeiro e
Castro
Discurso do
coordenador-geral do M1D
José Ribeiro e
Castro
Cerimónias
oficiais do 1.º de Dezembro
Lisboa, Praça
dos Restauradores
1 de Dezembro de
2013
Cá estamos de novo, com uma
gratidão que nunca conseguiremos pagar à Sociedade Histórica da Independência
de Portugal e à Câmara Municipal de Lisboa, por manterem ininterruptas desde há
mais de 100 anos as comemorações oficiais nacionais desta data fundamental do
nosso calendário.
O 1.º de Dezembro é o dia da nossa liberdade: não da liberdade individual, da
liberdade de cada um; mas da nossa liberdade colectiva nacional, da liberdade
de todos. Sem este dia, não seríamos.
Não é demais repetir o grito do Presidente da Sociedade Histórica há dois anos,
confrontado com a lamentável inteção do Governo de acabar com este feriado: o
1.º de Dezembro é a data sine qua non, a data sem a qual Portugal
livre, independente e soberano teria terminado. Não deixaremos que seja assim.
Nem que nos tirem a liberdade, nem que nos tirem a data oficial para a
afirmarmos e celebrarmos. Começa-se sempre a deixar-se de ser livre no dia em
que se perde a consciência disso – e do muito que custou.
Depois de terem apagado este dia, eliminado a solenidade nacional, é curioso
ver alguns precipitarem-se, agora, para equiparar a situação actual do País à
de 1640; e quem aprecie repetir, dia sim, dia sim, que estaríamos até num
quadro de «protectorado».
É facto que o País, mercê do endividamento desmesurado que acumulou, da
dependência que como devedor insolvente contraiu e da assistência externa que
teve de contratar, se encontra numa situação deplorável de soberania diminuída
e limitada. Acontece a todos os falidos. E é também verdade – como sempre
alertámos – que, se nunca há uma boa altura para acabar com o 1.º de Dezembro
(o único feriado em que celebramos o valor fundamental da independência
nacional), este tempo desgraçado e acabrunhado foi um momento particularmente
desastrado para o fazer. Este tempo reclama, ao contrário, que exaltemos todas
as referências que puxem pelo nosso sentido gregário, que alimentem o nosso
patriotismo, que fortaleçam a vontade e o brio em sermos livres, confiantes, de
cabeça erguida e passo firme.
Mas o paralelo acaba aí, no fortalecimento caloroso de sentimentos e emoções
nacionais, que são indispensáveis à travessia dos tempos de crise e ao triunfo
sobre a crise. A imagem do protectorado é engraçada e sugestiva uma vez; mas é
errada se repetida como mote ou estribilho. Nós não estamos sob protectorado.
Isso não é tecnicamente correcto. E, se fosse verdadeiro, seria ainda pior.
O meu professor de direito internacional público ensinou-me que o protectorado
é uma situação de acordo entre estados soberanos, em que o «protegido» perde
para o «protector» a direcção das suas relações internacionais e de defesa,
ficando subordinado à sua esfera, mas mantém instituições próprias e governo
interno. Ora, poderíamos dizer que a situação de Portugal é exactamente ao
contrário, pois fomos intervencionados não por um Exército, mas pelo Orçamento:
aquilo em que mantemos soberania e liberdade são a política externa e de
defesa, embora no quadro dos sistemas de alianças a que pertencemos; e onde
estamos diminuídos na nossa soberania é exactamente em todas as áreas de
governo interno, por isso que brutalmente condicionadas pelos constrangimentos
orçamentais do grande devedor fragilizado em que Portugal se tornou.
É errado excitarmo-nos com paralelos com 1640, como se a situação actual do
país fosse um outro 1580. Não é. Nós não fomos invadidos, nem estamos ocupados.
Não houve nenhuma questão sucessória que nos pusesse sob tutela. Não houve
nenhuma batalha que, ao perdê-la, nos submetesse. A troika não
é a Duquesa de Mântua e, se está cá, é porque a chamámos para nos socorrer da
nossa insolvência.
O perigo desses paralelismos ligeiros, quando levados além do estímulo saudável
ao nosso brito e à nossa vontade nacional livre, é apagarem a nossa própria
responsabilidade. E, nessa medida, não ajudarem a libertar-nos, mas arrastarem
a nossa decadência.
Os «invasores» que nos conduziram à difícil situação em que estamos somos nós
próprios. Fomos nós mesmos que nos invadimos; fomos nós mesmos que nos
colocámos neste buraco. E somos nós também que dele temos de sair.
Os nossos «invasores» são os que nos endividaram para além do tolerável: o
Estado, o sistema financeiro, outros ainda. Não é boa política gritar contra
estrangeiros, quando o mal está cá dentro – e temos de o superar e resolver
pela reforma do Estado e reorientação da economia. Não é sensato culparmos
estrangeiros em vez dos nossos maus governos, por cuja eleição só nós somos
responsáveis.
Não é boa política denunciarmos um falso «protectorado» para, de facto, agirmos
como um «acocorado». Na União Europeia, nós somos um Estado igual, um Estado
igual a todos os outros, um parceiro de todos os demais, um pilar de uma
construção comum. Não há protectorados na União Europeia: não há estados
directores e Estados vassalos. O discurso lamuriento do «protectorado» impede e
bloqueia aquela política europeia assertiva de que precisamos há tanto tempo:
uma política para a Europa, uma política para Portugal.
O 1.º de Dezembro é o dia certo para o lembrarmos. Este dia em que reafirmamos,
briosos, a Nação livre e independente dos portugueses é também o dia em que
podemos afirmar, sem embaraço, nem contradição, a vontade de construirmos e
defender a União Europeia como união de estados-nação, efectivamente iguais
entre si, livres e independentes, solidários e coesos.
Recordo duas ideias fundamentais que temos afirmado:
- O 1.º de
Dezembro não é um dia contra ninguém; é o dia a nosso favor.
- Este dia
não é propriedade de ninguém. Este dia é de todos – é o dia mais de todos
de entre todos os dias de Portugal.
Ao revigorarmos aqui, no dia
de hoje, com o projecto das bandas filarmónicas e o projecto das tunas
académicas, no cenário da Avenida da Liberdade, dos Restauradores e do Rossio,
o carácter popular e a inspiração jovem das celebrações anuais deste «novo 1.º
de Dezembro», sabemos que esta é a melhor forma de concretizarmos a absoluta
determinação do nosso Movimento: «Pedimos desculpa por esta interrupção: o
feriado segue dentro de momentos.»
Termino como ontem à noite:
Pedimos a Deus que nos proteja e a Portugal: que nos guarde, que nos inspire;
que guarde e inspire os nossos filhos e netos por muitos séculos por diante. Olhamos o futuro
com confiança.
Viva Portugal!