Paulo
Morais, Correio
da Manhã, 13.11.2012
A
fúria que muitos sentem relativamente à chanceler alemã Angela Merkel é
compreensível. Mas não foi Angela Merkel a responsável pelo estado a que
chegámos, pela crise em que nos mergulharam, pelo enorme endividamento das
famílias ou pelos esquemas de corrupção que exauriram as contas públicas. Foi
Cavaco Silva, e não Merkel, que enquanto primeiro-ministro permitiu o
desbaratar de fundos europeus em obras faraónicas e inúteis, desde piscinas e
pavilhões desportivos sem utentes, ao desnecessário Centro Cultural de Belém.
Foi o
seu ministro Ferreira do Amaral que hipotecou o estado no negócio da Ponte
Vasco da Gama.
Foi
António Guterres, e não Merkel, que decidiu esbanjar centenas de milhões de
euros na construção de dez estádios de futebol. Foi também no seu tempo que se
construiu o Parque das Nações, o negócio imobiliário mais ruinoso para o estado
em toda a história de Portugal.
Foi
mais tarde, já com Durão Barroso e o seu ministro da defesa Paulo Portas, que
ocorreu o caso de corrupção na compra de submarinos a uma empresa alemã. E
enquanto no país de Merkel os corruptores estão presos, por cá nada acontece.
Mas o
descalabro maior ainda estava para chegar.
Os
mandatos de José Sócrates ficarão para a história como aqueles em que os
socialistas entregaram os principais negócios de estado ao grande capital.
Concederam-se privilégios sem fim à EDP e aos seus parceiros das energias
renováveis; celebraram-se os mais ruinosos contractos de parceria
público-privada, com todos os lucros garantidos aos concessionários, correndo o
estado todos os riscos. O seu ministro Teixeira dos Santos nacionalizou e
assumiu todos os prejuízos do BPN.
Finalmente, chegou Passos Coelho, que prometeu não aumentar impostos nem
tocar nos subsídios, mas quando assumiu o poder, fez exactamente o contrário.
Também não é Merkel a culpada dessa incoerência, nem tão pouco é responsável
pelos disparates de Vítor Gaspar, que não pára de subir taxas de imposto. A
colecta diminui, a dívida pública cresce, a economia soçobra.
A raiva face aos dirigentes políticos deve ser
dirigida a outros que não à chanceler alemã. Aliás, os que fazem de Angela
Merkel o bode expiatório dos nossos problemas estão implicitamente a amnistiar
os verdadeiros culpados.