quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Bode expiatório

Paulo MoraisCorreio da Manhã, 13.11.2012

A fúria que muitos sentem relativamente à chanceler alemã Angela Merkel é compreensível. Mas não foi Angela Merkel a responsável pelo estado a que chegámos, pela crise em que nos mergulharam, pelo enorme endividamento das famílias ou pelos esquemas de corrupção que exauriram as contas públicas. Foi Cavaco Silva, e não Merkel, que enquanto primeiro-ministro permitiu o desbaratar de fundos europeus em obras faraónicas e inúteis, desde piscinas e pavilhões desportivos sem utentes, ao desnecessário Centro Cultural de Belém.

Foi o seu ministro Ferreira do Amaral que hipotecou o estado no negócio da Ponte Vasco da Gama.

Foi António Guterres, e não Merkel, que decidiu esbanjar centenas de milhões de euros na construção de dez estádios de futebol. Foi também no seu tempo que se construiu o Parque das Nações, o negócio imobiliário mais ruinoso para o estado em toda a história de Portugal.

Foi mais tarde, já com Durão Barroso e o seu ministro da defesa Paulo Portas, que ocorreu o caso de corrupção na compra de submarinos a uma empresa alemã. E enquanto no país de Merkel os corruptores estão presos, por cá nada acontece.

Mas o descalabro maior ainda estava para chegar.

Os mandatos de José Sócrates ficarão para a história como aqueles em que os socialistas entregaram os principais negócios de estado ao grande capital. Concederam-se privilégios sem fim à EDP e aos seus parceiros das energias renováveis; celebraram-se os mais ruinosos contractos de parceria público-privada, com todos os lucros garantidos aos concessionários, correndo o estado todos os riscos. O seu ministro Teixeira dos Santos nacionalizou e assumiu todos os prejuízos do BPN.

Finalmente, chegou Passos Coelho, que prometeu não aumentar impostos nem tocar nos subsídios, mas quando assumiu o poder, fez exactamente o contrário. Também não é Merkel a culpada dessa incoerência, nem tão pouco é responsável pelos disparates de Vítor Gaspar, que não pára de subir taxas de imposto. A colecta diminui, a dívida pública cresce, a economia soçobra.

A raiva face aos dirigentes políticos deve ser dirigida a outros que não à chanceler alemã. Aliás, os que fazem de Angela Merkel o bode expiatório dos nossos problemas estão implicitamente a amnistiar os verdadeiros culpados.





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