Pedro Vaz Patto
Parece que os nossos principais dirigentes
políticos estão finalmente a despertar para a gravidade da crise demográfica,
talvez a mais grave das crises estruturais com que se depara hoje o nosso País.
As taxas de natalidade atingem níveis dos mais baixos da nossa história e dos
mais baixos do mundo. E ultrapassam as mais pessimistas das previsões
anteriores.
Discutem-se agora várias medidas que possam
inverter essa tendência, desde reformas fiscais que acolham o sistema do
quociente familiar (em que as taxas são calculadas em função do número de
filhos, pois estes fazem diminuir a capacidade contributiva), a várias formas
de conciliação do trabalho e da vida familiar, ou ao combate ao desemprego
juvenil e à precariedade do emprego juvenil.
Ouve-se dizer que ao Estado não compete convencer
as pessoas a ter mais filhos (essas seriam opções puramente privadas), mas
apenas remover os obstáculos que impedem as pessoas de ter os filhos que
desejariam ter e que, de acordo com vários inquéritos, seriam suficientes para
assegurar a renovação das gerações (mas será mesmo assim?).
Todas essas medidas que se discutem são importantes
e algumas delas tiveram algum sucesso noutros países (em França ou nos países
nórdicos, por exemplo).
Penso, porém, que a crise demográfica só será
vencida com uma mudança cultural, uma mudança de mentalidade.
Na verdade, as gerações precedentes, que não
conheceram este problema, não experimentaram adversidades menores do que as de
hoje (apesar de então o emprego ser mais estável). A natalidade não é muito
maior em países economicamente mais prósperos, ou nos estratos sociais mais
abastados. Continua muito baixa em países com generosos apoios às famílias com
filhos, como a Alemanha. E mesmo em França e nos países nórdicos, em que as
taxas de natalidade são ligeiramente mais elevadas, estas não chegam para
assegurar a renovação das gerações.
A crise demográfica só será vencida com a
consciência de que a vida é sempre um dom e uma riqueza, que compensa
sacrifícios e renúncias. Já alguém disse que é o maior dom que recebemos e, por
isso, o maior que podemos dar. É ilusório pensar que se vence a crise
demográfica sem qualquer forma de renúncia a algum bem-estar material ou tempo
livre, ou sem contrariar a mentalidade individualista, hedonista e consumista
que hoje impera.
Por outro lado, não se vence a crise demográfica
sem vencer a crise da família. A rejeição do casamento como doação total e
compromisso definitivo não pode deixar de traduzir-se na rejeição da
natalidade. A fuga diante de escolhas definitivas, o viver projectado apenas no
imediato, sem um projecto que envolva toda a vida, leva também à recusa da que
é, talvez, a mais irreversível das opções: a de ter filhos. São famílias coesas
e estáveis as que optam por uma descendência mais numerosa.
Esta mudança de mentalidade que permitirá vencer a
crise demográfica não depende certamente do Estado, ou de medidas políticas.
Mas não estão em causa simples opções privadas sem reflexos sociais: Esses
reflexos estão agora à vista de todos. Não é apenas o futuro da Segurança
Social, ou do Estado Social, que está em causa, é o futuro de uma Nação.
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