terça-feira, 20 de março de 2012

As feridas da Igreja II



Na continuação do texto anterior, onde abordei a forma como foi implementada a Missa que hoje se celebra, debrucemo-nos hoje sobre o Rito da Comunhão.

Para uma melhor compreensão do erro aceite pela maioria, também aqui temos que retorceder ao final da década de sessenta.

Muitos têm a ideia de que a comunhão na mão vem do C. Vat. II, que a propôs, ordenou ou autorizou. Nada mais errado! Sabendo que o povo aceita qualquer mudança sem contestação, alguns teólogos trapaceiros assim nos quiseram fazer crer.

Em nenhuma sessão do Concílio houve uma tomada de posição a favor desta nova prática. A have-la, a decisão sairia pela maioria de votos. Mas os Padres Conciliares não se pronunciaram, porque a questão nunca foi debatida.

Depois do Concílio, foi o Santo Padre pressionado para que autorizasse a comunhão na mão, com base numa errada e abusiva interpretação do Artº 50 da Constituição Sacrosanctum Concílium, que diz sobre os ritos: «…restaurem-se, porém, se parecer oportuno ou necessário e segundo a antiga tradição dos Santos Padres, alguns que desapareceram com o tempo.»

Como tinha que dar uma resposta, o Papa submeteu a questão ao parecer de todos os Bispos da Igreja, que, por uma larga maioria, se pronunciaram contra a alteração do Rito, como podemos ver na Memoriale Domini (de 29-5-69), que diz a determinada altura:
«A partir dessas respostas, fica claro que a vasta maioria dos Bispos crê que a disciplina actual não deve ser modificada, e caso viesse, que a mudança seria ofensiva aos sentimentos e à cultura espiritual desses Bispos e de muitos fiéis.

Portanto, levando em consideração as observações e o conselho daqueles que “o Espírito Santo designou para governar” as Igrejas, tendo em vista a gravidade da matéria e a força dos argumentos postos em evidência, o Santo Padre decidiu não modificar a maneira existente de administrar a Santa Comunhão aos fiéis».

Ora, se o II Concílio Vaticano quis manter firmes os princípios do C. Trento, que na Sessão III deixa muito claro que deve manter-se a então vigente forma de comungar (na boca, por mãos do sacerdote) 1; se, após o C. Vaticano II, os Bispos de todo o mundo, juntamente com o Papa, disseram Não à comunhão na mão, como é que, como um vírus infernal, ela se alastrou a quase toda a Igreja?

Para quem tiver o mínimo de sinceridade intelectual, torna-se claro que a “autorização” foi fabricada à revelia da suprema autoridade da Igreja. Portanto, e dado que é uma “legalização” abusiva, forçada, não querida por Deus, cabe a cada um abandonar essa prática sacrílega, ou nela continuar sem querer ver que caminha para a sua condenação.

Aos Bispos, assim como às Conferências Episcopais, compete promover a unidade, observando sempre as prescrições da suprema autoridade da Igreja (Cf. CDC, Cân. 755, 2).Acha o leitor que foi isso que tiveram em conta quantos permitiram esta profanação? Com isso não fizeram precisamente o contrário, causando a divisão no Corpo místico de Cristo?

Todo o clérigo que, conscientemente, opta por seguir esta moda que veio do inferno (a comunhão na mão), é sacrílego. Comete igualmente sacrilégio todo o leigo que, depois de alertado para o erro, nele persiste.

Que pena eu tenho de vários Padres bons que conheço, mas que praticam o erro que lhes é incutido…

Quanto a esta desastrosa forma de receber Jesus na Eucaristia, não têm faltado profetas a alertarem-nos, como os incontornáveis Beatos Madre Teresa de Calcutá e João Paulo II. Mas como padecemos de um mal que só nos permite aceitar tudo quanto seja coisa nova, a voz de Deus não é por nós acolhida. Se o fosse, geraria automaticamente em nós a mudança que tanto Ele espera.

Por meio destes e outros arautos do Senhor, não se tem cansado o Céu de nos dizer o quão trágica para o mundo é esta falta de respeito para com o Santíssimo Sacramento. Mas, pelo que se vê, bem pode o Céu falar…

Na Instrução Inaestimabile Donum, referente ao Culto do Mistério Eucarístico, João Paulo II não poupa as palavras quando se refere àqueles que seguem por caminhos contrários aos estabelecidos pela Suprema Autoridae da Igreja: «Aquele que oferece culto a Deus em nome da Igreja, de um modo contrário ao qual foi estabelecido pela própria Igreja com a autoridade dada por Deus e o qual é também a tradição da Igreja, é culpado de falsificação.»

Em 24-2-80, na Dominicae Cenae, documento dirigido a todos os Bispos da Igreja, salvaguardando casos pontuais de real necessidade, que não é o caso daquilo que se vê em todas as igrejas e em todas as Missas, diz o mesmo Papa:   «O tocar nas sagradas Espécies e a distribuição destas com as próprias mãos é um privilégio dos ordenados».

Numa entrevista concedida a ACI Prensa, o actual Prefeito da Congregação para o Culto Divino e Disciplina dos Sacramentos, Cardeal Antonio Cañizares, em resposta à pergunta sobre a comunhão na mão, disse, creio que em Julho do ano passado: «É recomendável que os fiéis comunguem na boca e de joelhos».

Questionado sobre os abusos litúrgicos que se verificam actualmente, disse que é necessário «corrigi-los, sobretudo mediante uma boa formação: formação dos seminaristas, formação dos sacerdotes, formação dos catequistas, formação de todos os fiéis cristãos».

Quando interrogado sobre o costume instaurado por Bento XVI, de fazer com que os fiéis que recebem a Eucaristia das suas mãos a recebam na boca e de joelhos, disse que tal se deve «ao sentido que deve ter a comunhão, que é de adoração, de reconhecimento de Deus».

Recentemente, Monsenhor Athanasius Schneider, Bispo auxiliar em duas dioceses do Cazaquistão, especialista em Patrística e Igreja Primitiva, disse aos microfones da Rádio Maria (no sul do Tirol) que a comunhão na mão é um costume «completamente novo», sem raízes nos tempos dos primeiros cristãos, como se tem defendido com frequência. «Não tem nada a ver com a Igreja primitiva, é de origem calvinista.»

Em próxima edição iremos ainda mais fundo, à raiz desta erva daninha que está a sufocar a «semente lançada à terra».
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1 C. de Trento. Ses. XIII, c. 8


José Augusto Santos, As feridas da Igreja – II, in Notícias de Chaves, Nº. 3161

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