Guy Millière, Institute Gatestone, 27 de Abril de 2019
Dr. Guy Millière, professor da Universidade de Paris, é autor de 27 livros sobre a França e a Europa.
Original em inglês: The Burning of Notre Dame and the Destruction of Christian Europe
Tradução: Joseph Skilnik
Apenas uma hora após as chamas começarem a subir na Catedral de Notre Dame, quando não havia a menor possibilidade de explicar as causas do incêndio, as autoridades francesas apressaram-se em adiantar que o incêndio ocorreu em consequência de um «acidente» e «incêndio doloso foi descartado». As declarações soaram como todas e quaisquer declarações oficiais feitas pelo governo francês após a ocorrência de ataques em França na última década.
O incêndio na Catedral de Notre Dame ocorre justamente quando ataques contra igrejas em França e na Europa se estão a multiplicar. Mais de 800 igrejas foram atacadas em França só no ano de 2018.
As igrejas em França estão vazias. O número de padres está a diminuir e os padres que estão no activo em França estão muito velhos ou vêm de África ou da América Latina. Agora a religião dominante em França é o Islão. Todos os anos as igrejas são demolidas para dar lugar a estacionamentos ou shopping centers. As mesquitas estão a ser construídas em todos os lados e estão cheias.
O fogo que destruiu grande parte da Catedral de Notre Dame, no coração de Paris, é uma tragédia irreparável. Ainda que a catedral seja reconstruída, jamais será a mesma. Vitrais e importantíssimas estruturas arquitectónicas foram seriamente danificadas e a moldura de carvalho totalmente destruída. A flecha da catedral era uma obra de arte sem igual. Foi desenhada pelo arquitecto Eugène Viollet-le-Duc que restaurou a catedral no século XIX, baseando o seu trabalho em registros do século XII.
Além do incêndio, a água imprescindível para extinguir as chamas penetrou no calcário das paredes e da fachada, enfraquecendo-as, fragilizando-as. O telhado já não existe mais: a nave, o transepto e o coro encontram-se a céu aberto, vulneráveis ao mau tempo. Eles sequer têm condições de serem protegidos até que a estrutura seja examinada minuciosamente, tarefa que levará semanas. Três elementos primordiais da estrutura (o pinhão do transepto norte, o pinhão localizado entre as duas torres e a abóbada) também estão à beira do colapso.
A Catedral de Notre Dame tem mais de 800 anos. Sobreviveu à turbulência da Idade Média, ao Reino de Terror da Revolução Francesa, a duas Guerras Mundiais e à ocupação nazista de Paris. Não sobreviveu ao que a França se está a tornar no século XXI.
Até agora, a causa do incêndio foi atribuída a «um acidente» «um curto-circuito» e mais recentemente «a uma falha no computador».
Se realmente o incêndio fosse um acidente, seria praticamente impossível explicar como começou. Benjamin Mouton, ex-arquitecto chefe da Notre Dame, explicou que as normas eram excepcionalmente rígidas e que nenhum cabo nem aparelho eléctrico e nenhuma fonte de calor poderia estar no sótão. Salientou que havia um sistema de alarme extremamente sofisticado. A empresa que instalou o andaime não utilizou nenhuma soldagem e era especializada neste tipo de trabalho. O incêndio começou mais de uma hora após a saída dos funcionários e nenhum deles se encontrava nas dependências da Catedral. O fogo espalhou-se num piscar de olhos, os bombeiros correram imediatamente para o local, chegando lá ficaram estupefactos. Remi Fromont, arquitecto chefe dos monumentos históricos em França salientou: «No local onde o fogo começou não existia nenhum elemento que fosse a causa do incêndio. É preciso uma gigantesca fonte de calor para desencadear um desastre dessa magnitude».
Será realizada uma investigação longa, difícil e complexa.
A possibilidade de que o incêndio tenha ocorrido em consequência de um acto criminoso não pode ser descartada. Apenas uma hora após as chamas começarem a subir na Catedral de Notre Dame, quando não havia a menor possibilidade de explicar as causas do incêndio, as autoridades francesas apressaram-se em adiantar que o incêndio ocorreu em consequência de um «acidente» e «incêndio doloso foi descartado». As declarações soaram como todas e quaisquer declarações oficiais feitas pelo governo francês após a ocorrência de ataques em França na última década.
Em Novembro de 2015, na noite do massacre na Casa Noturna Bataclan, em Paris, quando os jihadistas assassinaram 90 pessoas, o ministério do Interior de França sustentou que o governo não sabia de nada, a não ser que tinha havido um tiroteio. A verdade veio à tona somente após o ISIS assumir a responsabilidade pelo massacre.
Em Nice, após o ataque dos camiões de Julho de 2016, o governo francês insistiu por vários dias que o terrorista que atropelou 86 pessoas era um «homem que havia sofrido colapso mental».
Em 2018, o assassino de Sarah Halimi, que recitou versos do Alcorão enquanto torturava a vítima, foi considerado «mentalmente perturbado», foi enviado a uma instituição psiquiátrica logo após a detenção. Provavelmente jamais será julgado. Em 8 de Abril, Alain Finkielkraut e outros 38 intelectuais publicaram um artigo realçando ser imperativo que o assassino não se esquive da justiça. O artigo não surtiu efeito.
O incêndio na Catedral de Notre Dame ocorreu menos de três anos depois que um «comando» de mulheres jihadistas, posteriormente presas, procurou destruir a Catedral detonando cilindros de gás natural. Três dias antes do incêndio da semana passada, em 12 de Abril, Ines Madani, líder dos jihadistas, um jovem francês convertido ao Islão, foi condenado a oito anos de prisão por criar um grupo terrorista filiado ao Estado Islâmico.
O incêndio na Catedral de Notre Dame ocorre justamente quando ataques contra igrejas em França e na Europa se estão a multiplicar. Mais de 800 igrejas foram atacadas em França só no ano de 2018. Muitas sofreram sérios danos: estátuas quebradas e decapitadas, tabernáculos destruídos, fezes atiradas contra as paredes. Atearam fogo em inúmeras igrejas. Em 5 de Março, a Basílica de St. Denis, onde estão enterrados todos os reis de França, menos três, foi profanada por um refugiado paquistanês. Vários vitrais foram quebrados e o órgão da basílica, um tesouro nacional construído entre 1834 e 1841, por pouco não foi totalmente destruído. Doze dias depois, em 17 de Março, atearam fogo em Saint Sulpice, a maior igreja de Paris, causando sérios danos. Após dias de silêncio, a polícia finalmente admitiu que foi criminosa a causa do incêndio.
Por meses a fio, organizações jihadistas vêm emitindo comunicados incentivando a destruição de igrejas e monumentos cristãos na Europa. A Catedral de Notre Dame foi reiteradamente apontada como alvo prioritário. Mesmo assim, a Catedral não estava adequadamente protegida. Em Novembro passado, dois jovens entraram na Catedral à noite, subiram ao telhado gravaram um vídeo e na sequência postaram-no no YouTube.
Um sem-número de mensagens foram postadas por pessoas com nomes muçulmanos nas redes sociais, Twitter, Facebook e no site da Al Jazeera, manifestando júbilo ao ver um importante símbolo cristão destruído. Hafsa Askar, uma imigrante de Marrocos e vice-presidente da União Nacional dos Estudantes de França (UNEF), a principal organização estudantil de França, postou um twite com os seguintes dizeres: «as pessoas estão a chorar por causa de pequenos pedaços de madeira... é uma ilusão de lixo branco».
O presidente francês Emmanuel Macron, que nunca se referiu aos ataques a Saint Denis ou Saint Sulpice, foi a correr até à Catedral de Notre Dame e declarou: «Notre Dame é a nossa história, a nossa literatura, a nossa imaginação». Deixou totalmente de fora a dimensão religiosa da catedral.
Na noite seguinte, disse que a Notre Dame seria reconstruída em cinco anos: sem dúvida uma declaração ousada. Muitos analistas interpretaram as palavras de Macron como sendo ditadas pelo desespero em recuperar a confiança do povo francês após cinco meses de manifestações, distúrbios e destruição decorrentes da sua ineficiente gestão no tocante à revolta dos «Coletes Amarelos». (Em 16 de Março, grande parte dos Champs-Élysées foi danificada por vândalos; os reparos mal começaram.) Os especialistas são unânimes em dizer que é praticamente certo que levará muito mais do que cinco anos para reconstruir a Catedral de Notre Dame.
Causa espécie que Macron tenha salientado que a catedral ficará ainda «mais bonita» do que antes, como se um monumento seriamente danificado poderia ficar mais bonito após a restauração. Macron então realçou que a reconstrução seria um «gesto arquitectónico contemporâneo». A observação suscitou apreensão, para não dizer pânico, entre os defensores de monumentos históricos, que agora temem que ele estaria disposto a incluir elementos arquitectónicos modernos a uma joia da arquitectura gótica. Mais uma vez, deixou totalmente de fora a dimensão religiosa da catedral.
A atitude de Macron não surpreende ninguém. A partir do momento em que se tornou presidente, manteve-se longe de qualquer cerimónia cristã. A maioria dos presidentes que o precederam fizeram o mesmo. A França é um país onde o secularismo dogmático supremo reina. Um líder político que se atreva a dizer que é cristão é imediatamente criticado nos media e só tende a prejudicar uma carreira política em ascensão. Nathalie Loiseau, ex-directora da Escola Nacional de Administração de França e candidata que estava no topo da lista dos candidatos do partido de Macron, «Em Marcha», para as eleições do Parlamento Europeu de Maio de 2019, foi recentemente fotografada a sair de uma igreja após a missa, o que levou a um debate nos media sobre a sua ida à igreja, se isso pode ser considerado um «problema».
As consequências do secularismo francês saltam aos olhos. O cristianismo foi praticamente eliminado da vida pública. As igrejas estão vazias. O número de padres está diminuindo e os padres que estão no activo em França estão muito velhos ou vêm de África ou da América Latina. Agora a religião dominante em França é o Islão. Todos os anos, igrejas são demolidas para dar lugar a estacionamentos ou shopping centers. As mesquitas estão a ser construídas em todos os lados e estão cheias. Imãs radicais são proselitistas. O assassinato, há três anos, de Jacques Hamel, um padre de 85 anos de idade que foi massacrado por dois islamistas enquanto celebrava a missa numa igreja onde apenas cinco pessoas (três freiras idosas) estavam presentes, já diz tudo.
Em 1905 o parlamento francês aprovou uma lei decretando que todas as propriedades da Igreja católica em França seriam confiscadas. Igrejas e catedrais passaram a ser propriedade do Estado. Desde então, sucessivos governos gastaram pouco dinheiro com a sua conservação. As igrejas que não foram profanadas estão em péssimo estado e a maioria das catedrais também está nas mesmas condições. Mesmo antes do devastador incêndio, a Arquidiocese de Paris declarou que «não tem condições de arcar com todas as despesas» necessárias para manter a Catedral de Notre Dame, «estimada em US$185 milhões». Segundo a CBS News, em 20 de Março de 2018:
O governo francês, dono da catedral, prometeu US$50 milhões para a próxima década, deixando uma conta em aberto de US$135 milhões. Para levantar o restante, Picaud ajudou a lançar a Fundação Amigos da Notre-Dame de Paris. Ela trabalha para encontrar doadores do sector privado tanto em França como do outro lado do Atlântico.
«Sabemos que os americanos são ricos, de modo que iremos onde acreditamos que temos condições de arrecadar dinheiro para ajudar a restaurar a catedral», salientou Picaud.
Na noite do incêndio na Catedral de Notre Dame, centenas de franceses aglomeraram-se em frente à catedral em chamas para cantar salmos e rezar. De repente, parecia que estavam a entender que estavam a perder algo imensamente precioso.
Após o incêndio, o governo francês decidiu receber doações de pessoas, empresas e organizações do sector privado para a reconstrução; foram arrecadados mais de um bilião de euros. Os bilionários franceses prometeram doar vultuosas somas de dinheiro: a família Pinault (os principais proprietários do conglomerado varejista Kering) prometeu 100 milhões de euros, a família Arnault (proprietária da LVMH, a maior empresa de artigos de luxo do mundo), 200 milhões de euros, a família Bettencourt (proprietária da L'Oréal), também 200 milhões. Muitos da «esquerda» francesa imediatamente disseram que as famílias abastadas tinham dinheiro demais e que esses milhões seriam melhor empregados se ajudassem os pobres ao invés de se preocuparem com pedras antigas.
Durante muito tempo, o coração de Paris terá que arcar com as terríveis cicatrizes de um incêndio que devastou muito mais do que uma catedral. O fogo destruiu uma parte essencial do que restou da alma quase perdida de França e do que a França podia realizar quando os franceses acreditavam em algo superior que a sua própria existência do dia-a-dia.
Alguns nutrem a esperança de que a visão da catedral destruída inspire muitos franceses a seguirem o exemplo daqueles que rezavam na noite do desastre. Michel Aupetit, arcebispo de Paris, salientou em 17 de Abril, dois dias depois do incêndio, que tinha total convicção que a França experimentaria um «despertar espiritual».
Outros, não tão optimistas, vêem nas cinzas da catedral um símbolo da destruição do cristianismo em França. O historiador de arte Jean Clair disse que vê na destruição da Catedral de Notre Dame mais um sinal da «irreversível decadência» da França e do colapso final das raízes judaico-cristãs da Europa.
O colunista americano Dennis Prager escreveu:
«O simbolismo do incêndio da Catedral de Notre Dame, a mais renomada construção da civilização ocidental, símbolo icônico da cristandade ocidental, é difícil de deixar passar.
«É como se o próprio Deus nos quisesse advertir, da maneira mais inequívoca possível, que o cristianismo ocidental está em chamas e juntamente com ele a civilização ocidental».
Outro escritor americano, Rod Dreher, observou:
«Esta catástrofe ocorrida em Paris é hoje um sinal para todos nós cristãos e um sinal para todas as pessoas no Ocidente, especialmente aqueles que desprezam a civilização que construiu este grande templo para o seu Deus numa Ilha no Sena onde ritos religiosos eram celebrados desde os dias da Roma pagã. É um alerta de que estamos a perder e do que não recuperaremos se não mudarmos de rumo agora».
Por agora, nada indica que a França e a Europa Ocidental mudarão de rumo.
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