Cada vez mais se ouve falar da defesa do «bem-estar
animal» e dos «direitos dos animais». Há quem pretenda boicotar o comércio de
artigos em pele ou do foie gras. Há quem proteste contra a caça e as
touradas. Foi anunciada uma proposta de alteração do Código Civil que cria o
estatuto dos «animais não humanos» como categoria distinta da das «coisas».
Quando já há alguns anos iniciei os meus estudos de Direito, ainda prevalecia uma visão antropocêntrica, que considerava o direito como algo especificamente humano (não se concebiam direitos dos animais) e que encarava as normas de protecção dos animais como orientadas ao interesse (económico ou sentimental) que estes têm para com os humanos. Penso que continua a ter sentido rejeitar a noção de «direitos dos animais» (como das plantas ou das montanhas), porque o direito supõe atributos de liberdade e responsabilidade que são prerrogativa exclusiva dos seres humanos. O direito supõe a liberdade de o seu titular (ainda que por interposta pessoa, quando há incapacidade) o exercer ou não. E não há direitos sem deveres e sem responsabilidades. Deve, então, falar-se em normas de protecção dos animais, e não tanto em «direitos dos animais». Mas já me parece errado conceber essas normas sempre em função do interesse instrumental que os animais possam ter para com os humanos.
A mensagem bíblica conduz-nos à exigência de respeito pela integridade da criação, a qual na expressão de Bento XVI, «exprime um desígnio de amor e verdade». Pode, assim, justificar-se a protecção de uma espécie animal em extinção, independentemente do interesse económico que ela possa representar. E justifica-se um especial respeito para com os seres sencientes, capazes de sentir a dor, mesmo que esta sensação de dor não seja inteiramente equiparável à que experimentam os seres humanos. Por este motivo, compreende-se que os animais não sejam equiparados às coisas como algo que está à arbitrária disposição do seu proprietário, que as pode tratar e destruir como entender. Isso não significa que eles não possam ser instrumentalizados em função de interesses humanos legítimos e de maior relevo ético. É moralmente aceitável fazer dos animais um instrumento ao serviço de necessidades humanas como a alimentação ou a investigação científica tendente à cura de doenças. Já não o será quando estão em causa interesses de simples divertimento, puramente sumptuários, ou a maximização do lucro (para além do legítimo sustento económico), em razão do qual pode a criação intensiva dos animais sacrificar o bem-estar destes. É discutível se a preservação de uma arte tradicional, como a tauromáquica, que se considera parte de um património cultural, pode justificar o sacrifício desse bem-estar. Mas é também a mensagem bíblica que nos conduz a distinguir o estatuto ontológico e ético da pessoa humana do dos outros animais. Esta foi criada «à imagem e semelhança de Deus» e é destinada a partilhar a vida de Deus.
De um ponto de vista apenas racional (abstraindo da revelação bíblica), só as pessoas humanas são agentes morais, ou seja, podem distinguir o bem do mal e livremente fazer opções em função dessa distinção (só elas podem reflectir a respeito do estatuto ético dos outros animais, por exemplo). Daqui lhes advém um estatuto de dignidade sem paralelo. Não podem nunca (como podem os animais em determinadas condições) ser tratadas como meio em relação a um fim que lhes é alheio, devem ser sempre tratadas como fim em si mesmas. Essa dignidade é, em relação aos outros seres, um privilégio e uma responsabilidade. É sobre essa dignidade que assenta todo o edifício dos direitos humanos fundamentais e toda a ordem jurídica que deles decorre.
Por exigências do princípio da igualdade e não discriminação, a dignidade humana não depende da capacidade efectiva de exercício das faculdades racionais que distinguem os seres humanos, Pelo contrário, é quando, por razões de idade ou doença (de particular vulnerabilidade, portanto), essas faculdades ainda não são efectivas, ou deixaram de o ser, que mais se justifica a protecção da ordem jurídica. E é por isso que não pode deixar de se sublinhar o contraste entre, por um lado, a consideração atribuída a muitas reivindicações animalistas e, por outro lado, a indiferença e apoio perante atentados contra a vida humana em qualquer das suas fases, a partir da fase embrionária.
Quando já há alguns anos iniciei os meus estudos de Direito, ainda prevalecia uma visão antropocêntrica, que considerava o direito como algo especificamente humano (não se concebiam direitos dos animais) e que encarava as normas de protecção dos animais como orientadas ao interesse (económico ou sentimental) que estes têm para com os humanos. Penso que continua a ter sentido rejeitar a noção de «direitos dos animais» (como das plantas ou das montanhas), porque o direito supõe atributos de liberdade e responsabilidade que são prerrogativa exclusiva dos seres humanos. O direito supõe a liberdade de o seu titular (ainda que por interposta pessoa, quando há incapacidade) o exercer ou não. E não há direitos sem deveres e sem responsabilidades. Deve, então, falar-se em normas de protecção dos animais, e não tanto em «direitos dos animais». Mas já me parece errado conceber essas normas sempre em função do interesse instrumental que os animais possam ter para com os humanos.
A mensagem bíblica conduz-nos à exigência de respeito pela integridade da criação, a qual na expressão de Bento XVI, «exprime um desígnio de amor e verdade». Pode, assim, justificar-se a protecção de uma espécie animal em extinção, independentemente do interesse económico que ela possa representar. E justifica-se um especial respeito para com os seres sencientes, capazes de sentir a dor, mesmo que esta sensação de dor não seja inteiramente equiparável à que experimentam os seres humanos. Por este motivo, compreende-se que os animais não sejam equiparados às coisas como algo que está à arbitrária disposição do seu proprietário, que as pode tratar e destruir como entender. Isso não significa que eles não possam ser instrumentalizados em função de interesses humanos legítimos e de maior relevo ético. É moralmente aceitável fazer dos animais um instrumento ao serviço de necessidades humanas como a alimentação ou a investigação científica tendente à cura de doenças. Já não o será quando estão em causa interesses de simples divertimento, puramente sumptuários, ou a maximização do lucro (para além do legítimo sustento económico), em razão do qual pode a criação intensiva dos animais sacrificar o bem-estar destes. É discutível se a preservação de uma arte tradicional, como a tauromáquica, que se considera parte de um património cultural, pode justificar o sacrifício desse bem-estar. Mas é também a mensagem bíblica que nos conduz a distinguir o estatuto ontológico e ético da pessoa humana do dos outros animais. Esta foi criada «à imagem e semelhança de Deus» e é destinada a partilhar a vida de Deus.
De um ponto de vista apenas racional (abstraindo da revelação bíblica), só as pessoas humanas são agentes morais, ou seja, podem distinguir o bem do mal e livremente fazer opções em função dessa distinção (só elas podem reflectir a respeito do estatuto ético dos outros animais, por exemplo). Daqui lhes advém um estatuto de dignidade sem paralelo. Não podem nunca (como podem os animais em determinadas condições) ser tratadas como meio em relação a um fim que lhes é alheio, devem ser sempre tratadas como fim em si mesmas. Essa dignidade é, em relação aos outros seres, um privilégio e uma responsabilidade. É sobre essa dignidade que assenta todo o edifício dos direitos humanos fundamentais e toda a ordem jurídica que deles decorre.
Por exigências do princípio da igualdade e não discriminação, a dignidade humana não depende da capacidade efectiva de exercício das faculdades racionais que distinguem os seres humanos, Pelo contrário, é quando, por razões de idade ou doença (de particular vulnerabilidade, portanto), essas faculdades ainda não são efectivas, ou deixaram de o ser, que mais se justifica a protecção da ordem jurídica. E é por isso que não pode deixar de se sublinhar o contraste entre, por um lado, a consideração atribuída a muitas reivindicações animalistas e, por outro lado, a indiferença e apoio perante atentados contra a vida humana em qualquer das suas fases, a partir da fase embrionária.
Sem comentários:
Enviar um comentário