1. Os demónios existem?
Sim, existem. «A existência dos seres espirituais, não-corporais, a que a
Sagrada Escritura habitualmente chama anjos, é uma verdade de fé»[2][2]. Alguns
desses anjos, criados bons por Deus, liderados por Satanás, também chamado
Diabo, «radical e irrevogavelmente recusaram Deus e o seu Reino»[3][3], e
portanto deve-se afirmar que «de facto, o Diabo e os outros demónios foram por
Deus criados naturalmente bons; mas eles, por si próprios, é que se fizeram
maus»[4][4].
2. Porque é que existem
alguns cristãos que negam a existência do demónio?
Alguns cristãos[5][5], entusiasmados com as grandes descobertas científicas dos últimos séculos, colocaram, erroneamente, uma confiança excessiva no método próprio das ciências experimentais e acabaram por negar a existência de realidades que, pela sua natureza, não são passíveis de estudo empírico, tais como, por exemplo, os seres puramente espirituais a que chamamos anjos.
3. Satanás pode causar todos os males que quer?
Não. «O poder de Satanás não é infinito. Satanás é uma simples criatura, poderosa pelo facto de ser um puro espírito»[6][6], isto é, um anjo que tal como todos os anjos «excedem em perfeição todas as criaturas visíveis»[7][7].
4. Qual é o maior mal que podem causar os demónios?
Os demónios «esforçam-se por associar o homem à sua rebelião contra Deus»[8][8] por induzir o homem ao pecado mortal o qual «tem como consequência a perda da caridade e a privação da graça santificante, ou seja, do estado de graça. E se não for resgatado pelo arrependimento e pelo perdão de Deus, originará a exclusão do Reino de Cristo e a morte eterna no Inferno»[9][9].
5. Quais são os pecados com os quais o demónio leva mais pessoas para o inferno?
Só Deus o sabe. Na nossa cultura, porém, sobressaem pela sua difusão, dois vícios especialmente graves: 1) A luxúria, idolatria do prazer sexual, em todas as suas formas (contracepção, masturbação, adultério, relações pré-matrimoniais, sexo oral, anal, etc.), que destrói a capacidade humana de amar, ou seja de a pessoa se dar a Deus e aos outros[10][10]; 2) A superstição pela qual divinizamos alguma criatura ou força criada, caindo assim na idolatria[11][11], na adivinhação[12][12] ou na magia[13][13]. Através destes pecados o demónio corrompe a nossa relação com Deus[14][14].
6. O demónio é o instigador de todos os nossos pecados e a causa de todos os males?
Não. Como ensina Jesus na parábola do semeador[15][15], às vezes somos levados a pecar movidos pelas seduções do mundo ou pelas nossas próprias más inclinações. «Não se deve acusar o Diabo em todas as coisas que acontecem, de facto, às vezes, o próprio homem faz de Diabo para si mesmo»[16][16].
7. Jesus Cristo já venceu o Diabo e os seus anjos?
Sim, «foi para destruir as obras do Diabo que apareceu o Filho de Deus» (1Jo 3,8). «Cristo, pelo mistério pascal da sua morte e ressurreição, livrou-nos da escravidão do Diabo e do pecado, derrubando o seu domínio e livrando todas as coisas dos contágios malignos»[17][17]. Porém, o Diabo embora já definitivamente vencido por Cristo na cruz ainda continua a exercer a sua acção maléfica no mundo e «essa acção é permitida pela divina Providência»[18][18], que do mal sabe tirar bens maiores[19][19]. «Um duro combate contra os poderes das trevas atravessa, com efeito, toda a história humana; começou no princípio do mundo e, segundo a palavra do Senhor, durará até ao último dia»[20][20].
8. Que tipos de acção exercem os demónios sobre este mundo?
«A maléfica e adversa acção do Diabo e dos demónios afecta pessoas, coisas e lugares, manifestando-se de diversos modos»[21][21].
9. Que tipo de capacidades naturais têm os anjos e os demónios?
Têm um certo domínio sobre as realidades materiais, por exemplo, podem mover objectos[22][22] e têm a capacidade de actuar sobre os nossos sentidos externos ou internos[23][23].
10. Os demónios podem fazer verdadeiros milagres?
Não, só Deus pode fazer milagres propriamente ditos, mas os demónios pelas suas capacidades naturais podem fazer coisas prodigiosas e extraordinárias que parecem aos homens milagres. De facto, por vezes, «quando os demónios realizam algo pelo seu poder natural, nós o chamamos de milagre, não de modo absoluto mas em relação à nossa capacidade [humana], e é assim que os bruxos realizam milagres graças aos demónios»[24][24].
11. O que é a parapsicologia?
É uma falsa ciência (pseudo-ciência) que se propõe de estudar os fenómenos ditos «para-normais», como, por exemplo, a telepatia, a clarividência, a mediunidade, as experiências extra-corpóreas, os espíritos, com o método científico das ciências experimentais. A comunidade cientifica mundial é unânime na crítica negativa que faz do valor científico dos métodos e dos resultados obtidos pela parapsicologia. Contrariamente, a teologia sempre soube explicar, partindo da Palavra de Deus, as verdadeiras causas dos fenómenos hoje chamados «para-normais», denominados tradicionalmente por «praeternaturais», apoiando-se sobretudo na angelologia.
12. Os demónios podem possuir as pessoas?
Normalmente aos demónios é apenas permitido pela Providência divina tentar os homens ao pecado, mas por vezes encontram-se casos de ataques diabólicos que vão muito para além das simples tentações. A maior parte destes distúrbios menos comuns estão directamente relacionados com formas de adivinhação[25][25] ou magia[26][26] em que explícita ou implicitamente os homens pedem à ajuda dos demónios[27][27]. Tais pactos, muitas vezes, conferem aos demónios a possibilidade de causar distúrbios que vão para além das simples tentações.
13. Que sinais podem indiciar a presença de distúrbios de origem diabólica?
Conhecer línguas desconhecidas à pessoa, bem como factos ocultos, manifestar uma força acima do normal e ter aversão às coisas sagradas[28][28]. Ver, ouvir, sentir, cheirar e imaginar coisas inexplicáveis à luz das ciências psicológicas. Ter doenças ou distúrbios somáticos inexplicáveis à luz das ciências médicas[29][29]. Acontecimentos estranhos com objectos e animais inexplicáveis à luz da ciência, como por exemplo, coisas que se movem do lugar sozinhas, electrodomésticos que se acendem e desligam sozinhos, etc.
14. O que é um malefício?
«O malefício é o poder de fazer mal a outros, graças a um pacto e com a ajuda dos demónios. Distingue-se da magia, a qual tem como objectivo realizar prodígios, enquanto este vem direcionado a fazer mal a alguém»[30][30].
15. Como se pode destruir um malefício?
Através de uma vida vivida na graça de Deus, da frequência dos sacramentos, principalmente da Eucaristia e da Reconciliação, dos sacramentais, de modo especial dos exorcismos, dos objectos religiosos abençoados, das peregrinações a lugares santos, da invocação dos santos, da destruição dos objectos utilizados no malefício e das orações de libertação[31][31].
16. O que é um exorcismo?
O exorcismo é um sacramental. Trata-se de uma celebração litúrgica em que «a Igreja pede publicamente e com autoridade, em nome de Jesus Cristo, que uma pessoa ou objecto seja protegido contra a acção do Maligno e subtraído ao seu domínio [...]. Sob uma forma simples, faz-se o exorcismo na celebração do Baptismo. O exorcismo solene, chamado «grande exorcismo», só pode ser feito por um presbítero e com licença do bispo»[32][32].
17. O que é uma oração de libertação?
É uma oração dirigida a Deus, em que, tal como na última petição do Pai Nosso, pedimos para ser libertados do influxo diabólico. «Ao pedirmos para sermos libertados do Maligno, pedimos igualmente para sermos livres de todos os males, presentes, passados e futuros, dos quais ele é autor ou instigador»[33][33].
18. Nos casos de pessoas que apresentem distúrbios diabólicos leves um sacerdote deve rezar orações de libertação mesmo não sendo exorcista?
Sim, deve. O Cardeal Schönborn num retiro internacional para sacerdotes em Ars afirmou: «É preciso distinguir bem o Grande Exorcismo, reservado ao bispo ou àquele em quem o bispo delegou – porque um exorcista não se improvisa – da oração de libertação que deveria ser normal para todos nós, padres. Trata-se de uma oração pronunciada com a autoridade de Jesus, dos Santos e dos Anjos, com o fim de interceder por uma pessoa, não possessa, mas infestada, perturbada por ataques do Maligno. É preciso prestar este serviço aos nossos fiéis, pois ele faz parte do nosso ministério de padre»[34][34].
19. Qualquer fiel pode rezar uma oração de libertação?
Sim, pode. O Senhor Jesus quer que todos os seus discípulos rezem o Pai Nosso e que portanto que peçam ao Pai que está nos céus a libertação «do poder do Maligno» (1Jo 5,19). Na última petição do Pai Nosso «o Mal não é uma abstracção, mas designa uma pessoa, Satanás, o Maligno, o anjo que se opõe a Deus»[35][35].
20. Qual a utilidade e eficácia de uma oração de libertação?
É eficaz como qualquer outra oração de petição a Deus[36][36]. Deve ser feita com as devidas disposições[37][37] e estar de acordo com o plano divino de amor e salvação para cada um de nós[38][38]. Concretamente, alcançam a graça que pedem, ou seja, a efectiva libertação do domínio diabólico e de todos os males causados pelos demónios. Além disso, ajudam a discernir eventuais casos de possessão, obsessão, vexação e infestação diabólica.
NOTAS
[1][1] Estas breves questões foram preparadas pelo Pe. Duarte Sousa Lara (www.santidade.net), exorcista e doutor em teologia.
[2][2] Catecismo da Igreja Católica, n. 328.
[3][3] Catecismo da Igreja Católica, n. 391.
[4][4] Concílio de Latrão IV, cap. 1, De fide catholica: DH 800.
[5][5] Cf. R. Bultmann, Nuovo Testamento e mitologia. Il manifesto della demitizzazione, Bescia 1970, pp. 109-110: «A fé acerca da existência dos espíritos e dos demónios está liquidada pela conhecimento das forças e das leis da natureza. [...] Não se pode usar a luz eléctrica e a rádio, servir-se dos modernos instrumentos médicos e químicos nos casos de doença, e depois acreditar no mundo dos espíritos e dos milagres do Novo Testamento».
[6][6] Catecismo da Igreja Católica, n. 395.
[7][7] Catecismo da Igreja Católica, n. 329.
[8][8] Ritual Romano. Rito dos exorcismos, Proémio.
[9][9] Catecismo da Igreja Católica, n. 1861.
[10][10] Afirmava a Beata Jacinta Marto pouco antes de morrer: «Os pecados que levam mais almas para o inferno, são os pecados da carne» (J. M. De Marchi, Era uma Senhora mais brilhante que o Sol, 17ª ed., Editora Missões Consolata, Fátima 2000, p. 267).
[11][11] Cf. Ex 20,2-17: «Eu sou o Senhor teu Deus, que te tirei da terra do Egipto, dessa casa da escravidão. Não terás outros deuses perante Mim. Não farás de ti nenhuma imagem esculpida, nem figura que existe lá no alto do céu ou cá em baixo na terra ou nas águas debaixo da terra. Não te prostrarás diante delas nem lhes prestarás culto porque eu, o Senhor teu Deus, sou um Deus cioso castigo a ofensa dos pais nos filhos até à terceira e quarta geração daqueles que Me ofendem; mas uso de misericórdia até à milésima geração com aqueles que Me amam e guardam os meus mandamentos».
[12][12] Cf. Afonso Maria de Ligório (santo), Theologia moralis, Tipografia Vaticana, Roma 1905, tom. 1, lib. 3, tract. 1, cap. 1, dub. 2, n. 5:«A adivinhação dá-se quando alguém invoca a ajuda tácita ou explícita dos demónios a fim de conhecer coisas futuras contingentes (não necessárias) ou coisas ocultas que não se podem conhecer naturalmente».
[13][13] Cf. ibidem, dub. 4, n. 15:«A vã observância, tal como a adivinhação, é de sua natureza (ex genere suo) um pecado mortal. Porque atribui honras divinas às creaturas esperando dessas algo que só de Deus devemos esperar e também porque tenta entrar em pacto com o demónio».
[14][14] Cf. ibidem, dub. 1, n. 1:«A superstição é a falsificação da religião, ou culto vicioso».
[15][15] Cf. Mt 13,3-8.18-23; Mc 4,3-9.13-20; Lc 8,5-8.11-15.
[16][16] Agostinho de Hipona (santo), Serm. 163/B, 5.
[17][17] Ritual Romano. Rito dos exorcismos, Proémio.
[18][18] Catecismo da Igreja Católica, n. 395.
[19][19] Cf. Rom 8,28: «Ora nós sabemos que todas as coisas concorrem para o bem daqueles que amam a Deus».
[20][20] Concílio Vaticano II, Gaudium et spes, n. 37.
[21][21] Ritual Romano. Rito dos exorcismos, Proémio.
[22][22] Cf. At 12,7-10: «De repente apareceu um anjo do Senhor, e uma luz resplandeceu no recinto. O anjo, batendo no lado de Pedro, despertou-o, dizendo: «Levanta-te depressa!». E caíram as correntes das suas mãos. O anjo disse-lhe: «Toma o teu cinto e calça as tuas sandálias!». E ele assim fez. E disse-lhe: «Põe sobre ti a tua capa e segue-me!». Ele, saindo, seguia-o sem dar conta de que era realidade o que se fazia por intervenção do anjo, antes julgava ter uma visão. Depois de passarem a primeira e a segunda guarda, chegaram à porta de ferro que dá para a cidade, a qual se abriu por si mesma. Saindo, passaram uma rua, e imediatamente o anjo afastou-se dele»; Tomás de Aquino (santo), Summa theologiae, I, q. 110, a. 3, ad 3: «a potência motora da alma limita-se ao corpo a ela unido, que ela vivifica, e mediante o qual pode mover outros corpos. No entanto, a potência do anjo não é limitada a um corpo, podendo assim mover localmente corpos aos quais não está unida».
[23][23] Cf. Tomás de Aquino (santo), Summa theologiae, I, q. 111, a. 3, c.: «O anjo, bom ou mau, pode, em virtude da sua natureza, mover a imaginação do homem»; Ibidem, a. 4, c.: «O anjo pode agir sobre os sentidos do homem».
[24][24] Tomás de Aquino (santo), Summa theologiae, I, q. 110, a. 4, ad 2.
[25][25] Cf. At 16,16-19: «Aconteceu que, um dia, indo nós à oração, nos veio ao encontro uma jovem escrava que tinha um espírito pitónico, e que com as suas adivinhações dava muito lucro a seus amos. Ela, seguindo-nos a Paulo e a nós, gritava, dizendo: «Estes homens são servos do Deus excelso e vos anunciam o caminho da salvação». E fez isto muitos dias. Paulo, porém, enfadado, tendo-se voltado para ela, disse ao espírito: «Ordeno-te, em nome de Jesus Cristo, que saias dessa mulher». E ele na mesma hora saiu. Mas, vendo seus amos que se lhes tinha acabado a esperança do lucro, pegando em Paulo e em Silas, os levaram ao foro, às autoridades»; Agostinho de Hipona (santo), De divinatione daemonum liber unus: PL 40; Tomás de Aquino (santo), Summa theologiae, II-II, q. 95, a. 2, c.: «toda a adivinhação é obra dos demónios».
[26][26] Cf. At 19,18-19: «Muitos dos que tinham acreditado iam confessar e declarar as suas práticas. Muitos também daqueles que se tinham dedicado à magia, trouxeram os seus livros e queimaram-nos diante de todos»; Agostinho de Hipona (santo), De Trinitate, 3,7,12: «os anjos prevaricadores [...] que conferem à magia todo o poder que essa tem».
[27][27] Cf. Tomás de Aquino (santo), Summa theologiae, II-II, q. 95, a. 2, ad 2: «esse modo de adivinhação é culto aos demónios, enquanto com eles se fazem pactos implícitos ou explícitos».
[28][28] Cf. Ritual Romano. Rito dos exorcismos, Preliminares, n. 16.
[29][29] Cf. Lc 13,11: «Estava lá uma mulher possessa de um espírito que a tinha doente havia dezoito anos; andava encurvada, e não podia levantar a cabeça».
[30][30] Afonso Maria de Ligório (santo), Theologia moralis, Tipografia Vaticana, Roma 1905, tom. 1, lib. 3, tract. 1, cap. 1, dub. 5, n. 23.
[31][31] Cf. ibidem, n. 24:«Contra os malefícios é lícito utilizar: 1) Os remédios da ciência médica [...]. 2) Os exorcismos e os sacramentos da Igreja, as peregrinações, as invocações dos santos, etc. 3) A destruição dos sinais por meio dos quais o demónio ataca».
[32][32] Catecismo da Igreja Católica, n. 1673.
[33][33] Catecismo da Igreja Católica, n. 2854.
[34][34] Christoph Schönborn (cardeal), La joie d'être prêtre. A la suite du Curé d'Ars, ouverture par le pape Benoît XVI, Éditions des Béatitudes, Nouan-le-Fuzelier 2009, p. 90.
[35][35] Catecismo da Igreja Católica, n. 2851.
[36][36] Cf. Jo 16,24: «pedi e recebereis»; Mt 7,7-8: «Pedi, e vos será dado; buscai, e achareis; batei, e abrir-se-vos-á. Porque todo aquele que pede, recebe, e quem busca, encontra; e a quem bate, abrir-se-á».
[37][37] Feita em nome de Jesus (cf. Jo 16,23: «se pedirdes a Meu Pai alguma coisa em Meu nome, Ele vo-la dará»), com fé (Mt 21,22: «tudo o que pedirdes com fé na oração alcançá-lo-eis»; Tg 1,6: «peça-a com fé, sem nada hesitar»), com humildade (Lc 18,10-14; Catecismo da Igreja Católica, n. 2559: «A humildade é o fundamento da oração»), perseverança (cf. Rom 12,12: «perseverantes na oração») e de preferência em grupo (cf. Mt 18,19: «se dois de vós se unirem entre si sobre a terra a pedir qualquer coisa, esta lhes será concedida por Meu Pai que está nos céus»).
[38][38] Cf. Lc 22,42: «Pai, se quiseres, afasta de Mim este cálice; não se faça, contudo, a Minha vontade, mas a Tua»; 2Cor 12,8-9: «roguei três vezes ao Senhor que o apartasse de mim, mas Ele disse-me: ‘Basta-te a Minha graça, porque é na fraqueza que o Meu poder se manifesta por completo’».
Alguns cristãos[5][5], entusiasmados com as grandes descobertas científicas dos últimos séculos, colocaram, erroneamente, uma confiança excessiva no método próprio das ciências experimentais e acabaram por negar a existência de realidades que, pela sua natureza, não são passíveis de estudo empírico, tais como, por exemplo, os seres puramente espirituais a que chamamos anjos.
3. Satanás pode causar todos os males que quer?
Não. «O poder de Satanás não é infinito. Satanás é uma simples criatura, poderosa pelo facto de ser um puro espírito»[6][6], isto é, um anjo que tal como todos os anjos «excedem em perfeição todas as criaturas visíveis»[7][7].
4. Qual é o maior mal que podem causar os demónios?
Os demónios «esforçam-se por associar o homem à sua rebelião contra Deus»[8][8] por induzir o homem ao pecado mortal o qual «tem como consequência a perda da caridade e a privação da graça santificante, ou seja, do estado de graça. E se não for resgatado pelo arrependimento e pelo perdão de Deus, originará a exclusão do Reino de Cristo e a morte eterna no Inferno»[9][9].
5. Quais são os pecados com os quais o demónio leva mais pessoas para o inferno?
Só Deus o sabe. Na nossa cultura, porém, sobressaem pela sua difusão, dois vícios especialmente graves: 1) A luxúria, idolatria do prazer sexual, em todas as suas formas (contracepção, masturbação, adultério, relações pré-matrimoniais, sexo oral, anal, etc.), que destrói a capacidade humana de amar, ou seja de a pessoa se dar a Deus e aos outros[10][10]; 2) A superstição pela qual divinizamos alguma criatura ou força criada, caindo assim na idolatria[11][11], na adivinhação[12][12] ou na magia[13][13]. Através destes pecados o demónio corrompe a nossa relação com Deus[14][14].
6. O demónio é o instigador de todos os nossos pecados e a causa de todos os males?
Não. Como ensina Jesus na parábola do semeador[15][15], às vezes somos levados a pecar movidos pelas seduções do mundo ou pelas nossas próprias más inclinações. «Não se deve acusar o Diabo em todas as coisas que acontecem, de facto, às vezes, o próprio homem faz de Diabo para si mesmo»[16][16].
7. Jesus Cristo já venceu o Diabo e os seus anjos?
Sim, «foi para destruir as obras do Diabo que apareceu o Filho de Deus» (1Jo 3,8). «Cristo, pelo mistério pascal da sua morte e ressurreição, livrou-nos da escravidão do Diabo e do pecado, derrubando o seu domínio e livrando todas as coisas dos contágios malignos»[17][17]. Porém, o Diabo embora já definitivamente vencido por Cristo na cruz ainda continua a exercer a sua acção maléfica no mundo e «essa acção é permitida pela divina Providência»[18][18], que do mal sabe tirar bens maiores[19][19]. «Um duro combate contra os poderes das trevas atravessa, com efeito, toda a história humana; começou no princípio do mundo e, segundo a palavra do Senhor, durará até ao último dia»[20][20].
8. Que tipos de acção exercem os demónios sobre este mundo?
«A maléfica e adversa acção do Diabo e dos demónios afecta pessoas, coisas e lugares, manifestando-se de diversos modos»[21][21].
9. Que tipo de capacidades naturais têm os anjos e os demónios?
Têm um certo domínio sobre as realidades materiais, por exemplo, podem mover objectos[22][22] e têm a capacidade de actuar sobre os nossos sentidos externos ou internos[23][23].
10. Os demónios podem fazer verdadeiros milagres?
Não, só Deus pode fazer milagres propriamente ditos, mas os demónios pelas suas capacidades naturais podem fazer coisas prodigiosas e extraordinárias que parecem aos homens milagres. De facto, por vezes, «quando os demónios realizam algo pelo seu poder natural, nós o chamamos de milagre, não de modo absoluto mas em relação à nossa capacidade [humana], e é assim que os bruxos realizam milagres graças aos demónios»[24][24].
11. O que é a parapsicologia?
É uma falsa ciência (pseudo-ciência) que se propõe de estudar os fenómenos ditos «para-normais», como, por exemplo, a telepatia, a clarividência, a mediunidade, as experiências extra-corpóreas, os espíritos, com o método científico das ciências experimentais. A comunidade cientifica mundial é unânime na crítica negativa que faz do valor científico dos métodos e dos resultados obtidos pela parapsicologia. Contrariamente, a teologia sempre soube explicar, partindo da Palavra de Deus, as verdadeiras causas dos fenómenos hoje chamados «para-normais», denominados tradicionalmente por «praeternaturais», apoiando-se sobretudo na angelologia.
12. Os demónios podem possuir as pessoas?
Normalmente aos demónios é apenas permitido pela Providência divina tentar os homens ao pecado, mas por vezes encontram-se casos de ataques diabólicos que vão muito para além das simples tentações. A maior parte destes distúrbios menos comuns estão directamente relacionados com formas de adivinhação[25][25] ou magia[26][26] em que explícita ou implicitamente os homens pedem à ajuda dos demónios[27][27]. Tais pactos, muitas vezes, conferem aos demónios a possibilidade de causar distúrbios que vão para além das simples tentações.
13. Que sinais podem indiciar a presença de distúrbios de origem diabólica?
Conhecer línguas desconhecidas à pessoa, bem como factos ocultos, manifestar uma força acima do normal e ter aversão às coisas sagradas[28][28]. Ver, ouvir, sentir, cheirar e imaginar coisas inexplicáveis à luz das ciências psicológicas. Ter doenças ou distúrbios somáticos inexplicáveis à luz das ciências médicas[29][29]. Acontecimentos estranhos com objectos e animais inexplicáveis à luz da ciência, como por exemplo, coisas que se movem do lugar sozinhas, electrodomésticos que se acendem e desligam sozinhos, etc.
14. O que é um malefício?
«O malefício é o poder de fazer mal a outros, graças a um pacto e com a ajuda dos demónios. Distingue-se da magia, a qual tem como objectivo realizar prodígios, enquanto este vem direcionado a fazer mal a alguém»[30][30].
15. Como se pode destruir um malefício?
Através de uma vida vivida na graça de Deus, da frequência dos sacramentos, principalmente da Eucaristia e da Reconciliação, dos sacramentais, de modo especial dos exorcismos, dos objectos religiosos abençoados, das peregrinações a lugares santos, da invocação dos santos, da destruição dos objectos utilizados no malefício e das orações de libertação[31][31].
16. O que é um exorcismo?
O exorcismo é um sacramental. Trata-se de uma celebração litúrgica em que «a Igreja pede publicamente e com autoridade, em nome de Jesus Cristo, que uma pessoa ou objecto seja protegido contra a acção do Maligno e subtraído ao seu domínio [...]. Sob uma forma simples, faz-se o exorcismo na celebração do Baptismo. O exorcismo solene, chamado «grande exorcismo», só pode ser feito por um presbítero e com licença do bispo»[32][32].
17. O que é uma oração de libertação?
É uma oração dirigida a Deus, em que, tal como na última petição do Pai Nosso, pedimos para ser libertados do influxo diabólico. «Ao pedirmos para sermos libertados do Maligno, pedimos igualmente para sermos livres de todos os males, presentes, passados e futuros, dos quais ele é autor ou instigador»[33][33].
18. Nos casos de pessoas que apresentem distúrbios diabólicos leves um sacerdote deve rezar orações de libertação mesmo não sendo exorcista?
Sim, deve. O Cardeal Schönborn num retiro internacional para sacerdotes em Ars afirmou: «É preciso distinguir bem o Grande Exorcismo, reservado ao bispo ou àquele em quem o bispo delegou – porque um exorcista não se improvisa – da oração de libertação que deveria ser normal para todos nós, padres. Trata-se de uma oração pronunciada com a autoridade de Jesus, dos Santos e dos Anjos, com o fim de interceder por uma pessoa, não possessa, mas infestada, perturbada por ataques do Maligno. É preciso prestar este serviço aos nossos fiéis, pois ele faz parte do nosso ministério de padre»[34][34].
19. Qualquer fiel pode rezar uma oração de libertação?
Sim, pode. O Senhor Jesus quer que todos os seus discípulos rezem o Pai Nosso e que portanto que peçam ao Pai que está nos céus a libertação «do poder do Maligno» (1Jo 5,19). Na última petição do Pai Nosso «o Mal não é uma abstracção, mas designa uma pessoa, Satanás, o Maligno, o anjo que se opõe a Deus»[35][35].
20. Qual a utilidade e eficácia de uma oração de libertação?
É eficaz como qualquer outra oração de petição a Deus[36][36]. Deve ser feita com as devidas disposições[37][37] e estar de acordo com o plano divino de amor e salvação para cada um de nós[38][38]. Concretamente, alcançam a graça que pedem, ou seja, a efectiva libertação do domínio diabólico e de todos os males causados pelos demónios. Além disso, ajudam a discernir eventuais casos de possessão, obsessão, vexação e infestação diabólica.
NOTAS
[1][1] Estas breves questões foram preparadas pelo Pe. Duarte Sousa Lara (www.santidade.net), exorcista e doutor em teologia.
[2][2] Catecismo da Igreja Católica, n. 328.
[3][3] Catecismo da Igreja Católica, n. 391.
[4][4] Concílio de Latrão IV, cap. 1, De fide catholica: DH 800.
[5][5] Cf. R. Bultmann, Nuovo Testamento e mitologia. Il manifesto della demitizzazione, Bescia 1970, pp. 109-110: «A fé acerca da existência dos espíritos e dos demónios está liquidada pela conhecimento das forças e das leis da natureza. [...] Não se pode usar a luz eléctrica e a rádio, servir-se dos modernos instrumentos médicos e químicos nos casos de doença, e depois acreditar no mundo dos espíritos e dos milagres do Novo Testamento».
[6][6] Catecismo da Igreja Católica, n. 395.
[7][7] Catecismo da Igreja Católica, n. 329.
[8][8] Ritual Romano. Rito dos exorcismos, Proémio.
[9][9] Catecismo da Igreja Católica, n. 1861.
[10][10] Afirmava a Beata Jacinta Marto pouco antes de morrer: «Os pecados que levam mais almas para o inferno, são os pecados da carne» (J. M. De Marchi, Era uma Senhora mais brilhante que o Sol, 17ª ed., Editora Missões Consolata, Fátima 2000, p. 267).
[11][11] Cf. Ex 20,2-17: «Eu sou o Senhor teu Deus, que te tirei da terra do Egipto, dessa casa da escravidão. Não terás outros deuses perante Mim. Não farás de ti nenhuma imagem esculpida, nem figura que existe lá no alto do céu ou cá em baixo na terra ou nas águas debaixo da terra. Não te prostrarás diante delas nem lhes prestarás culto porque eu, o Senhor teu Deus, sou um Deus cioso castigo a ofensa dos pais nos filhos até à terceira e quarta geração daqueles que Me ofendem; mas uso de misericórdia até à milésima geração com aqueles que Me amam e guardam os meus mandamentos».
[12][12] Cf. Afonso Maria de Ligório (santo), Theologia moralis, Tipografia Vaticana, Roma 1905, tom. 1, lib. 3, tract. 1, cap. 1, dub. 2, n. 5:«A adivinhação dá-se quando alguém invoca a ajuda tácita ou explícita dos demónios a fim de conhecer coisas futuras contingentes (não necessárias) ou coisas ocultas que não se podem conhecer naturalmente».
[13][13] Cf. ibidem, dub. 4, n. 15:«A vã observância, tal como a adivinhação, é de sua natureza (ex genere suo) um pecado mortal. Porque atribui honras divinas às creaturas esperando dessas algo que só de Deus devemos esperar e também porque tenta entrar em pacto com o demónio».
[14][14] Cf. ibidem, dub. 1, n. 1:«A superstição é a falsificação da religião, ou culto vicioso».
[15][15] Cf. Mt 13,3-8.18-23; Mc 4,3-9.13-20; Lc 8,5-8.11-15.
[16][16] Agostinho de Hipona (santo), Serm. 163/B, 5.
[17][17] Ritual Romano. Rito dos exorcismos, Proémio.
[18][18] Catecismo da Igreja Católica, n. 395.
[19][19] Cf. Rom 8,28: «Ora nós sabemos que todas as coisas concorrem para o bem daqueles que amam a Deus».
[20][20] Concílio Vaticano II, Gaudium et spes, n. 37.
[21][21] Ritual Romano. Rito dos exorcismos, Proémio.
[22][22] Cf. At 12,7-10: «De repente apareceu um anjo do Senhor, e uma luz resplandeceu no recinto. O anjo, batendo no lado de Pedro, despertou-o, dizendo: «Levanta-te depressa!». E caíram as correntes das suas mãos. O anjo disse-lhe: «Toma o teu cinto e calça as tuas sandálias!». E ele assim fez. E disse-lhe: «Põe sobre ti a tua capa e segue-me!». Ele, saindo, seguia-o sem dar conta de que era realidade o que se fazia por intervenção do anjo, antes julgava ter uma visão. Depois de passarem a primeira e a segunda guarda, chegaram à porta de ferro que dá para a cidade, a qual se abriu por si mesma. Saindo, passaram uma rua, e imediatamente o anjo afastou-se dele»; Tomás de Aquino (santo), Summa theologiae, I, q. 110, a. 3, ad 3: «a potência motora da alma limita-se ao corpo a ela unido, que ela vivifica, e mediante o qual pode mover outros corpos. No entanto, a potência do anjo não é limitada a um corpo, podendo assim mover localmente corpos aos quais não está unida».
[23][23] Cf. Tomás de Aquino (santo), Summa theologiae, I, q. 111, a. 3, c.: «O anjo, bom ou mau, pode, em virtude da sua natureza, mover a imaginação do homem»; Ibidem, a. 4, c.: «O anjo pode agir sobre os sentidos do homem».
[24][24] Tomás de Aquino (santo), Summa theologiae, I, q. 110, a. 4, ad 2.
[25][25] Cf. At 16,16-19: «Aconteceu que, um dia, indo nós à oração, nos veio ao encontro uma jovem escrava que tinha um espírito pitónico, e que com as suas adivinhações dava muito lucro a seus amos. Ela, seguindo-nos a Paulo e a nós, gritava, dizendo: «Estes homens são servos do Deus excelso e vos anunciam o caminho da salvação». E fez isto muitos dias. Paulo, porém, enfadado, tendo-se voltado para ela, disse ao espírito: «Ordeno-te, em nome de Jesus Cristo, que saias dessa mulher». E ele na mesma hora saiu. Mas, vendo seus amos que se lhes tinha acabado a esperança do lucro, pegando em Paulo e em Silas, os levaram ao foro, às autoridades»; Agostinho de Hipona (santo), De divinatione daemonum liber unus: PL 40; Tomás de Aquino (santo), Summa theologiae, II-II, q. 95, a. 2, c.: «toda a adivinhação é obra dos demónios».
[26][26] Cf. At 19,18-19: «Muitos dos que tinham acreditado iam confessar e declarar as suas práticas. Muitos também daqueles que se tinham dedicado à magia, trouxeram os seus livros e queimaram-nos diante de todos»; Agostinho de Hipona (santo), De Trinitate, 3,7,12: «os anjos prevaricadores [...] que conferem à magia todo o poder que essa tem».
[27][27] Cf. Tomás de Aquino (santo), Summa theologiae, II-II, q. 95, a. 2, ad 2: «esse modo de adivinhação é culto aos demónios, enquanto com eles se fazem pactos implícitos ou explícitos».
[28][28] Cf. Ritual Romano. Rito dos exorcismos, Preliminares, n. 16.
[29][29] Cf. Lc 13,11: «Estava lá uma mulher possessa de um espírito que a tinha doente havia dezoito anos; andava encurvada, e não podia levantar a cabeça».
[30][30] Afonso Maria de Ligório (santo), Theologia moralis, Tipografia Vaticana, Roma 1905, tom. 1, lib. 3, tract. 1, cap. 1, dub. 5, n. 23.
[31][31] Cf. ibidem, n. 24:«Contra os malefícios é lícito utilizar: 1) Os remédios da ciência médica [...]. 2) Os exorcismos e os sacramentos da Igreja, as peregrinações, as invocações dos santos, etc. 3) A destruição dos sinais por meio dos quais o demónio ataca».
[32][32] Catecismo da Igreja Católica, n. 1673.
[33][33] Catecismo da Igreja Católica, n. 2854.
[34][34] Christoph Schönborn (cardeal), La joie d'être prêtre. A la suite du Curé d'Ars, ouverture par le pape Benoît XVI, Éditions des Béatitudes, Nouan-le-Fuzelier 2009, p. 90.
[35][35] Catecismo da Igreja Católica, n. 2851.
[36][36] Cf. Jo 16,24: «pedi e recebereis»; Mt 7,7-8: «Pedi, e vos será dado; buscai, e achareis; batei, e abrir-se-vos-á. Porque todo aquele que pede, recebe, e quem busca, encontra; e a quem bate, abrir-se-á».
[37][37] Feita em nome de Jesus (cf. Jo 16,23: «se pedirdes a Meu Pai alguma coisa em Meu nome, Ele vo-la dará»), com fé (Mt 21,22: «tudo o que pedirdes com fé na oração alcançá-lo-eis»; Tg 1,6: «peça-a com fé, sem nada hesitar»), com humildade (Lc 18,10-14; Catecismo da Igreja Católica, n. 2559: «A humildade é o fundamento da oração»), perseverança (cf. Rom 12,12: «perseverantes na oração») e de preferência em grupo (cf. Mt 18,19: «se dois de vós se unirem entre si sobre a terra a pedir qualquer coisa, esta lhes será concedida por Meu Pai que está nos céus»).
[38][38] Cf. Lc 22,42: «Pai, se quiseres, afasta de Mim este cálice; não se faça, contudo, a Minha vontade, mas a Tua»; 2Cor 12,8-9: «roguei três vezes ao Senhor que o apartasse de mim, mas Ele disse-me: ‘Basta-te a Minha graça, porque é na fraqueza que o Meu poder se manifesta por completo’».
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