Fernanda Leitão
Os dias que desembocaram no 5 de Outubro de 2012 foram um verdadeiro fim de festa, com acontecimentos e pormenores que por muito tempo ficarão na memória do povo.
Começou com António Borges, um homem de mão do Goldman Sachs, a passar rodas de “ignorantes” aos empresários, com a desfaçatez de quem considera Miguel de Vasconcelos um menino de coro se comparado com a sua pessoa. Logo depois Victor Gaspar anunciou medidas de austeridade tais que pulverizam a classe média e empurram Portugal para o abismo. E fê-lo raivosamente, como quem atira pedras aos governados, a dar-se ares de pimpão, respaldado pelo Moedas do Goldman Sachs. Logo depois, no debate parlamentar, quando um deputado do PC lia a carta do líder do CDS aos seus militantes condenando a austeridade excessiva, Passos Coelho e Relvas, ao lado de um Paulo Portas calado e cabisbaixo, e de um Álvaro amarrotado como um papel sem préstimo, riam-se sem pudor nem maneiras. Foi uma cena de inacreditável baixeza.
Chegado o país à última celebração estadual da República, por decisão do governo bota-abaixo que o PSD e o CDS ofereceram a Portugal, a opinião pública ficou a saber que o primeiro-ministro trocava a celebração caseira por uma daquelas reuniões no estrangeiro onde é sempre um verbo de encher. E que o Presidente da República não queria a cerimónia no largo da Câmara de Lisboa, como sempre foi desde 1910, preferindo o escondido recato do Pátio da Galé, e mesmo ali só para convidados. Ao comprimento e à largura de Portugal, foi dito alto e bom som pelo “melhor povo do mundo” que o PR e o governo fugiam às garantidas vaias e apupos.
Umas imagens televisivas da Eslováquia mostraram Passos Coelho e Paulo Portas, caminhando apressados como quem foge da própria sombra, com o dirigente do CDS a declarar que a coligação está firme, “claro”. Não há que ter dúvidas: o país está entregue a uns garotões que mascaram a incompetência e o medo com a tosca desenvoltura da insolência.
Na varanda do município, o PR hasteou a bandeira de pernas para o ar. Pouca sorte a da bandeira verde-rubra: já foi pisada em Londres (1), numa manifestação contra a presença de Marcelo Caetano, já foi arrastada pelo chão em África, na hora derradeira da presença secular de Portugal. E agora, o azar quis que desse ao mundo a imagem de Portugal: virado do avesso. No Pátio da Galé, aconteceu o ponto final: António Costa fez um discurso de PR e o PR fez um discurso descolorido de representante de um governo partidário a desfazer-se em bocados. E, apesar da horda de seguranças, o “melhor povo do mundo”, na pessoa de duas bravas mulheres, deixou os convidados em silêncio atordoado e o PR a engolir em seco: uma senhora de meia -dade que gritava o seu desespero pelo desemprego e uma pensão de 200 euros, que era ali a voz de milhões, e uma jovem cantora lírica que entoou um cântico de resistência e foi ali o prolongamento de toda uma juventude prestes a explodir.
Haverá quem, não se revendo neste regime, se regozije com este descalabro. Eu não me regozijo. Amo demasiado Portugal para não sofrer com toda esta lama que o salpica e com a tremenda desgraça que atinge o povo a que pertenço.
Mas acredito que o “melhor povo do mundo” se levantará como uma só pessoa e salvará Portugal desta vergonha e de uma ditadura. Não há União Europeia nem Merkel, nem o grande raio que parta os que vivem da desgraça alheia, que possa impedir um povo de tomar em mãos o seu futuro.
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(1) Refere-se a um suposto e divulgado acto de Mário Soares em Londres. Isto não corresponde à realidade. Corresponde sim a «críticas» de quem não tem capacidade política para mais nem honestidade intelectual. É daquelas mentiras postas a circular por uma direita estúpida (sim, não é só a esquerda que é estupida!) que, repetidas que são, acabam por fazer fé. E muitas pessoas repetem a mesma história como se fosse verdade, como aqui neste artigo é o caso.
A uma direita consequente não será preciso inventar para criticar Mário Soares. Ou será? A verdade não será suficiente para criticar os socialistas?
É como aquela história de uma suposta carta de Rosa Coutinho a Agostinho Neto, que andou a circular na net. Para criticar esse traste seria preciso inventar? Só a direita estúpida o faria, e ainda por cima com o rabo de fora.
Mais uma vez, sobre o caso, é pena que um bom artigo contenha tal «voz corrente» que já enjoa ouvir.
A uma direita consequente não será preciso inventar para criticar Mário Soares. Ou será? A verdade não será suficiente para criticar os socialistas?
É como aquela história de uma suposta carta de Rosa Coutinho a Agostinho Neto, que andou a circular na net. Para criticar esse traste seria preciso inventar? Só a direita estúpida o faria, e ainda por cima com o rabo de fora.
Mais uma vez, sobre o caso, é pena que um bom artigo contenha tal «voz corrente» que já enjoa ouvir.
(Nota da Redacção)
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