Nuno Serras Pereira
1. Poderá um Sacerdote ou um Bispo aconselhar em quem votar ou desaconselhar de votar. Segundo o Cardeal Pell, que recentemente se pronunciou sobre o assunto, qualquer um deles tem plena legitimidade de o fazer, em circunstancias habituais, pois qualquer um deles é cidadão, como todas as outras pessoas.
Em Maio do ano passado escrevi dois pequenos textos sobre as presidenciais[1] nos quais sugeria que não se votasse em Cavaco Silva, em virtude das “leis” injustas, iníquas e criminosas que promulgou, cooperando desse modo formalmente com o mal intrínseco das mesmas e tornando-se moralmente responsável por todos os males, previstos e imprevistos, cometidos ao abrigo dessa mesmas “leis” [2] . Neles propunha, uma vez que os restantes candidatos padecem do mesmo mal, uma abstenção generalizada, com um propósito determinado. O facto de não sugerir o voto branco não se deveu somente ao facto de ele não contar como voto expresso mas também à circunstância de me parecer praticamente impossível persuadir um número significativo de pessoas a saírem de casa para irem votar desse modo. Continuo pois a favorecer a desmobilização eleitoral, pela abstenção.[3]
2. Desde então, e agora com maior frequência, tem-se advogado a escolha de Cavaco Silva em nome do “mal menor”. Este mal dito menor é defendido fundamentalmente por dois motivos. O primeiro consiste em pensar que Cavaco Silva é uma garantia que muito poderá ajudar na resolução da grave crise económica. Mutatis mutandi essa seria uma razão para votar em Hitler em vez de Stalin, caso a eleição se disputasse entre os dois. Julgue o leitor se seria oportuno e lícito escolher o primeiro. Eu, por mim, recusar-me-ia, evidentemente, a votar em qualquer um deles. O segundo motivo prende-se com a Fé. Cavaco diz que acredita em Deus e que é um católico praticante. Alegre pelo contrário professa o ateísmo. Ora, segundo alguns sempre será melhor eleger alguém que acredita em Deus do que quem n’ Ele não crê. Esta afirmação, porém, parece esquecer duas coisas. A primeira prende-se com o que o Papa Bento XVI e toda a história da Igreja têm ensinado, a saber, que os piores inimigos da mesma se encontram dentro dela e não fora. E a segunda de que há uma fé que é pior do que a ausência dela. Trata-se da fé dos demónios, de que fala S. Tiago na sua Carta. O P. António Vieira, desenvolvendo este tema num dos seus sermões acusa, num tempo dado à perseguição dos judeus, os cristãos de serem piores do que esses nossos irmãos mais velhos, precisamente, por terem uma fé como a dos demónios[4]. Essa fé acredita em todas as verdades acerca de Deus, de Cristo, da Igreja, etc., mas não se conforma com a vontade de Deus, não é operante, ignorando não só a Caridade e a Justiça mas indo mesmo contra elas. É uma fé cadavérica, morta, aquela que não tem obras. E se as que tem são contra o Amor e a Justiça é escabrosa, macabra, pestilencial, diabólica. E essa fé, segundo um filósofo judeu, que era ateu e se converteu ao catolicismo, Fabrice Hadjadj, é pior do que o ateísmo[5].
Alguém tem dúvidas, do tipo de fé que é revelado pelas leis promulgadas pelo actual presidente da república? As árvores conhecem-se pelos seus frutos, diz o Senhor no Evangelho.
3. Dantes, alguns manuais de moral, nos dias de hoje superados pela Encíclica O Esplendor da Verdade, diziam que entre dois males inevitáveis devia-se escolher o menor. Ora ninguém é obrigado a votar em qualquer um dos candidatos pelo que não está perante uma escolha má inevitável. A verdade, porém, é que nunca se pode escolher o mal e mesmo que alguém pense em consciência que deve escolher entre algum deles terá de fazê-lo por um bem e nunca por um mal.
De qualquer modo, parece-me claro que nas últimas décadas os eleitores têm vindo a escolher de “mal menor” em “mal menor” caindo sucessivamente nos piores males.
4. Uma vitória à primeira volta e retumbante do actual presidente-candidato constituiria uma consagração triunfal de todas as infâmias e crueldades de que foi cúmplice, uma sagração das políticas antivida, antifamília, antiliberdade de ensino e de educação, antiliberdade religiosa, anti, enfim, princípios e valores inegociáveis. Seria uma validação e premiação do maquiavelismo, da mais baixa imoralidade do falso e pernicioso axioma de que os fins justificam os meios. Seria uma proclamação de que tudo é permitido e nada impedido. Se desta vez não é penalizado nem punido nas urnas quem tanto mal fez em tão breve tempo, será imparável e irreversível, por muitos anos, a degradação e estragação dos católicos na política.
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