sexta-feira, 27 de junho de 2014
A moral de Luís Grave Rodrigues,
militante ateísta
Jairo Filipe, neoateismoportugues.blogs.sapo.pt, 6 de Fevereiro de 2011
Encontra-se no blogue Random Precision um excelente texto para analisarmos a credibilidade moral e ética do advogado Luís Grave Rodrigues, destacado e feroz membro da Associação Ateísta Portuguesa.
Não tem a ver com ateísmo. Mas como já escrevi neste blogue, quem age apontando o dedo aos outros ao mesmo tempo que enche a boca com auto-elogios de que defende a ética, princípios e valores; está nesse momento a legitimar que os visados por si, ou qualquer outra pessoa, critiquem a sua conduta na procura desses exemplos. Para quem não conhece a militância moralista deste sujeito, Luís Grave Rodrigues é um sujeito perturbado sabe-se lá pelo quê, que classifica todos os católicos como assassinos, pelo simples facto de serem católicos.
Feita a introdução, agora a análise do seu texto «O outro Bibi», em que ele analisa publicamente a estratégia de defesa de um outro advogado, num processo que ainda está em curso.
Resumidamente, houve um sujeito que confessou em tribunal os crimes de abuso de menores de que era acusado, tendo sido condenado a 18 anos de cadeia. Passado uns tempos, deu uma entrevista a um jornal dizendo-se inocente, contrariando portanto a sua posição ao longo do julgamento. Eis o comentário de Grave Rodrigues:
«a táctica de defesa adoptada por Carlos Silvino sempre constituiu para mim o exemplo acabado do que o bom senso e os mais básicos manuais de direito penal e processual penal aconselham a não fazer.»
A táctica foi confessar os crimes e colaborar com a Justiça. Qual manual de direito penal ou processual penal aconselham a não fazer isto? Nenhum.
O que Graves Rodrigues faz é colocar nesses códigos o seu cálculo amoral. Um advogado ter uma ideia da pena a que se pode sujeitar um cidadão acusado de determinado número de crimes, e aconselhá-lo a não colaborar nem confessar para tentar que ele seja considerado culpado do menor número possível; é bastante diferente de constar nos manuais de direito o conselho «sempre que acusados de muitos crimes, os réus devem ser aconselhados pelos seus advogados a não os confessarem».
O advogado criticado por Grave Rodrigues deparou-se com um sujeito acusado de agredir muitas crianças, de maneira muito cruel. Esse sujeito disponibilizou-se a confessar. À partida, não é de admitir que um inocente aceite confessar um crime tão horroroso e socialmente odiado, se não tiver a noção de que cometeu esse crime.
Já aqui temos uma distinção:
– Perante um sujeito acusado e disposto a confessar ter agredido crianças, o seu então advogado aceitou o caso com essa linha de defesa. A confissão.
– Perante um sujeito acusado e disposto a confessar ter agredido crianças, o advogado Grave Rodrigues optaria por aconselhá-lo a não confessar.
Um advogado cheio de princípios, este último. Em frente:
«Como era seu direito, Carlos Silvino poderia ter-se defendido negando toda a acusação e afirmando desconhecer todos os outros arguidos e a sua implicação no caso. Poderia ter-se apresentado, também ele, como uma vítima da Casa Pia e dos alunos mais velhos que ele, e principalmente, de um sistema que durante décadas ignorou placidamente o destino daqueles miúdos.»
Tal arguido poderia ter-se defendido, negando tudo e vitimizando-se. Mas será que eticamente deveria fazê-lo, caso fosse realmente culpado?
Isso não importa para o ético Grave Rodrigues. Se ele é inocente ou não, não interessa. Se as crianças foram ou não agredidas, é indiferente. Os advogados de supostos pedófilos não devem ter por referência a culpa ou inocência dos seus clientes, mas apenas o objectivo amoral de os livrarem o mais que puderem. A gazela e o leão têm interesses opostos, mas nenhum está certo ou errado. Viva a aplicação do darwinismo na Justiça.
«Ao invés, Carlos Silvino confessou-se culpado de nada menos que 669 crimes de abuso sexual de menores, e disparou à esquerda e à direita a implicar todos os restantes arguidos sentados ao seu lado, confirmando e contando histórias muitas vezes mirabolantes e inverosímeis, decerto à procura de atenuantes ou de uma clemência que era óbvio que nunca lhe dariam.»
Espera aí, se o sujeito foi capaz de confessar 669 crimes tão hediondos, não pode ser acusado de ter disparado para todo lado a ver se tinha atenuantes. Ele está é a disparar para si próprio. Quem encontrou e fez a sugestão de atenuantes foi Grave Rodrigues, a de vitimização perante a acusação.
Se o arguido acusou também todos os outros, isso por si só não retira nenhuma credibilidade à sua confissão. A hipótese dele tentar incriminar outros para se livrar mais facilmente seria plausível, apenas se anteriormente ele não se tivesse auto-incriminado livremente daquela maneira.
«Optou ainda por agigantar o caso e dar-lhe incomensuráveis proporções nacionais, ao descrever um sistema e uma recorrência que pareciam resultar de uma autêntica quadrilha organizada de facínoras violadores de crianças.»
Sim, é um facto. A sua confissão de fazer parte de uma máfia pedófila contribuiu para isso. E depois? É claro que isso não o beneficiou na sentença, mas nada nos diz que não existisse mesmo tal máfia. O que seria mais importante para um advogado confrontado com um cliente disposto a confessar ter feito parte de uma organização criminosa tão nojenta? Dizer que não queria saber nada disso, talvez...
«Não faço a mínima ideia de quem ali é culpado ou inocente, nem estou a ignorar o quanto centenas de miúdos devem ter sofrido durante anos e anos. Mas não é isso que agora está em causa, nem o imbróglio jurídico que daqui vai resultar; refiro-me simplesmente à mera e simples táctica de defesa de um arguido que, em vez de minimizar e de reduzir as proporções do processo em que está envolvido, decide antes em dar-lhe proporções gigantescas.»
É claro que é isso, sofrimento de centena de miúdos, que está aqui em causa. Temos um advogado a criticar publicamente outro, sobre um caso que envolve sofrimento de centenas de miúdos. E que está mais preocupado em mostrar como o otário do colega não foi capaz de olhar apenas para o interesse do arguido acusado e disposto a confessar ter abusado de menores.
«O resultado era previsível: lixou-se! Lixou-se porque, como seria por demais óbvio para qualquer estudante de Direito, a condenação só poderia ser proporcional à desmedida dimensão do caso, dada paradoxal e estupidamente à partida pelo próprio... Carlos Silvino.»
Sim, lixou-se. Mas, caso seja mesmo culpado, agiu correctamente ou não? Se ele fez mesmo tanto mal a crianças, o seu advogado foi um homem sério em optar pela confissão e colaboração com a Justiça? Grave Rodrigues acha que não. Esse advogado foi estúpido porque não percebe que o direito é um mero jogo.
E agora, a melhor parte:
«Não acredito numa palavra do que Carlos Silvino diz agora, do copo com água drogada às sevícias dos agentes da Polícia Judiciária.»
Ah, então a convicção de Grave Rodrigues é a de que Carlos Silvino estava a dizer a verdade quando confessou tudo durante o julgamento, e não agora que se queixa dos efeitos secundários de suposto copo com água que o obrigou a confessar crimes ao longo desses anos.
Concordo. Não é muito plausível que um sujeito se disponibilize a confessar 669 crimes tão horríveis, se acreditar que está inocente. E não é credível a teoria de que um copo com água marada possa provocar um efeito desta magnitude.
Mas então, qual é o problema de Luís Grave Rodrigues? Aparentemente, um pedófilo confesso vai passar 18 anos na cadeia porque o advogado que o representou optou pela estratégia da confissão. Esse advogado fez um bem às vítimas, à comunidade e ao próprio condenado, que se sujeita a um castigo merecido. Perante um pedófilo confesso, qualquer pessoa normal é capaz de compreender que a solução é ele ser bem castigado, pagar pelo seu crime, ser levado a reconhecer que tem um sério problema, a ganhar consciência daquilo que fez aos inocentes e a dar-lhe uma pequena hipótese, ainda que praticamente impossível, de reabilitação moral. Coisa que se convencionou fazer com uns valentes anos na prisão.
Mas eis a conclusão de Grave Rodrigues, sobre o facto do condenado ter negado a sua confissão, agora que trocou de advogado:
«a explicação para Carlos Silvino apresentar agora esta nova posição se torna muito simples: não sei quem ele é, mas ao que parece Carlos Silvino arranjou finalmente um advogado que pelos vistos sabe o que está a fazer...»
E com esta declaração final se percebe quão desenvolvida é a consciência moral do valoroso defensor da ética, Luís Grave Rodrigues. Um advogado que sabe o que está a fazer é aquele que tenta alterar uma condenação por abuso de menores, desde que represente alguém condenado por abuso de menores. Não interessa a Grave Rodrigues se a condenação foi justa ou não. Ele até acha que a conversa do copo de água é treta, mas esta nova estratégia é que é de alguém que sabe interpretar o direito. Há que elogiar publicamente aquilo que Grave Rodrigues confessa acreditar ser treta.
É esta uma das referências do humanismo secular militante português. Não é ironia. O humanismo secular é mesmo isto. E Grave Rodrigues realmente representa-o com mestria. São depois tipos como este que ficam histéricos e com pose de autoridade moral, sempre que surge um boato mediático de que o Vaticano planeou esquemas para contornar a entrega de padres pedófilos à condenação dos tribunais.
O acima referido arguido do processo Casa Pia goza do direito constitucional à presunção de inocência até eventual trânsito em julgado de sentença condenatória.
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